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EXAMES PRÉ-CÂNCER : Estudo da UFPel já apontava dúvidas em pesquisa de 2014

20 julho
08:48 2018

Ausência de resultados alterados chamou atenção de médica em 2014

Um estudo desenvolvido pela médica Júlia Kanaan Recuero, especialista em Saúde da Família, apresentado em 2014, e intitulado “Melhoria da Atenção ao Programa de Detecção e Prevenção dos Cânceres de Mama e Colo de Útero na Unidade de Saúde Bom Jesus, no município de Pelotas RS” traz mais uma evidência de que a Prefeitura de Pelotas sabia da suspeita dos profissionais acerca da veracidade dos exames pré-câncer realizados no município.

Dra. Júlia Recuero

Dra. Júlia Recuero

A pesquisa da Dra. Júlia Recuero foi realizada durante o ano de 2014, apresentado à Coordenadoria do Curso de Especialização em Saúde da Família. Foi analisado e aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Faculdade de Medicina da UFPel.

“O trabalho teve como objetivo geral apresentar ações visando melhorar a atenção à Saúde da Mulher na Unidade Básica de Saúde Bom Jesus”, diz a Dra. Júlia Recuero.

Logo no início das atividades ela constatou diversos problemas. “Nossas mesas ginecológicas estão com defeito, possuímos problemas com o recebimento de materiais essenciais como luvas, espéculos e períodos que faltam até receituários controlados. As normas de biossegurança e vigilância sanitária precisam de intervenção”, dizia ela no trabalho. “É importante ressaltar que o acesso ao local em dias de chuva torna-se bastante difícil devido aos grandes alagamentos e falta de pavimentação”, situações essas que não mudaram desde aquele ano.

DESCONFIANÇA

Afora os problemas estruturais, o estudo da Dra. Júlia Kanaan Recuero levanta a dúvida quanto aos exames citopatológicos realizados na UBS Bom Jesus. “Absolutamente todos os exames citopatológicos realizados tiveram resultado negativo para neoplasia, não houve aparecimento de nenhuma alteração displásica”, relata a Especialista em Saúde da Família e segue: “Algumas dessas mulheres tinham clinicamente lesões de alta sugestibilidade de alteração, porém com resultado negativo”, relatou a médica.

Sobre a estrutura disponibilizada pela Secretaria de Saúde de Pelotas ela ainda comenta que “ficou evidente que a quantidade de vagas para o exame citopatológico era insuficiente, apenas 05 fichas em um turno semanal”.

PAULA abordou várias questões durante encontro com jornalistas

PAULA abordou várias questões durante encontro com jornalistas

AMOSTRAS COLETADAS CORRETAMENTE

Uma questão que chegou a ser levantada por representante do laboratório, de que as amostras coletadas poderiam ser inviáveis é rebatida no levantamento da Dra. Recuero. “Quanto a análise qualitativa da intervenção tínhamos como meta obter 100% de coleta de amostras satisfatórias do exame citopatológico do colo do útero. Tal objetivo foi alcançado”.

Todos os exames de pré-câncer coletados na Unidade foram encaminhados ao laboratório de patologia indicado pela Secretaria de Saúde. “Mesmo assim, tivemos problemas quanto aos materiais para a realização dos exames, alguns comprados com dinheiro da equipe, como por exemplo o lugol (uma mistura de iodo) e as luvas”, explica.

Durante um ano de estudo na UBS Bom Jesus a médica conseguiu identificar na comunidade daquela região mulheres com alto risco para as neoplasias de mama e colo do útero. “Os Agentes Comunitários de Saúde, que são o elo mais próximo com a população, trazem relatos dentro do bairro”. Mas nenhum resultado dos exames coletados apontava para o mesmo caminho. “A intervenção poderia ter sido facilitada se houvesse, a partir da Secretaria de Saúde uma melhor informação das usuárias”, diz a médica. O que a equipe fez foi informar as pacientes a respeito de alguns sinais de detecção precoce do câncer do colo do útero.

“Logo que iniciei o trabalho, no início do ano de 2014, percebi a necessidade da melhoria da qualidade do atendimento do programa de saúde da mulher. Assim, iniciamos um projeto para que isso fosse realizado e para isso a equipe analisou os manuais nos quais o Ministério da Saúde explica como deve ser um atendimento completo dessas mulheres”, relata. “Nossa intenção com essa atividade foi melhorar o atendimento dessas pacientes”, finaliza a Dra. Júlia Kanaan Recuero.

RELATÓRIO PARA OS GESTORES

O estudo científico gerou um relatório direcionado para os gestores da época – secretária de Saúde Arita Bergmann e Prefeito Municipal Eduardo Leite, a respeito da atividade elaborada durante o período em que a médica Júlia Recuero esteve na UBS Bom Jesus realizando o Programa de Valorização da Atenção Básica.

Além disso, o minucioso trabalho de pesquisa e extensão realizado pela Especialista em Saúde da Família, está disponível – para todos – no Sistema de Bibliotecas da Universidade Federal de Pelotas e também no UnaSUS, no link https://ares.unasus.gov.br/acervo/handle/ARES/4053

Prefeita afirma que não recebeu novos documentos

Em entrevista coletiva na tarde de ontem, a prefeita Paula Schild Mascarenhas (PSDB) negou ter conhecimento de outros documentos que relatavam as suspeitas e inseguranças dos profissionais da área de saúde sobre a veracidade dos exames citopatológicos.

Porém, um estudo realizado por uma médica da UFPel, especialista em Saúde da Família, foi realizado em 2014 e teve relatório endereçado aos gestores da época.

“Precisamos de mais respostas, mais luz neste assunto. Precisamos saber se houve fraude; se não houve fraude, mas foram detectados erros acima dos aceitáveis; ou se não houve problemas e o laboratório agiu corretamente” disse Paula

“Precisamos de mais respostas, mais luz neste assunto. Precisamos saber se houve fraude; se não houve fraude, mas foram detectados erros acima dos aceitáveis; ou se não houve problemas e o laboratório agiu corretamente” disse Paula

Durante a coletiva a prefeita repetiu os anúncios feitos. Abriu uma sindicância para apurar o caso, mas não informou o prazo para a conclusão dos trabalhos, já que dependerá da reanálise das lâminas dos exames citopatológicos. Paula disse também que um laboratório se habilitou ao chamamento público na tarefa de substituir o atual, para que as mulheres de Pelotas mantenham a continuidade dos exames pré-câncer.

“Recebi a informação de que um laboratório apresentou proposta, ela é bem acima da tabela do SUS, por isso vamos esperar o parecer da Procuradoria Geral do Município, para então contratar o serviço”, disse a prefeita.

Perguntada o por quê da demora da secretária Ana Costa ter tomado providências, um ano depois de ter recebido o Memorando alertando sobre as suspeitas, Paula disse que a Prefeitura já havia sim, tomado medidas como a fiscalização do laboratório pela Vigilância Sanitária. Ana Costa negou em entrevista ao DIÁRIO DA MANHÃ que tenha recebido denúncia formal e disse que sabia do problema “há apenas algumas semanas”.

A prefeita encaminhou um ofício ao laboratório com questionamentos sobre quantos profissionais são responsáveis pelas análises dos exames citopatológicos. “Parece que é apenas um profissional, mas preciso aguardar as respostas ao ofício”. Outra dúvida levantada pela prefeitura era sobre quando este único técnico tira férias, como são feitos os exames.

“Solicitamos reuniões com representantes do laboratório, que foram marcadas e desmarcadas, pelo menos duas vezes. Marcamos outro encontro, mas novamente foi desmarcado por eles, temos como comprovar os pedidos de reunião, então estamos nos relacionando apenas por ofícios”, disse Paula. Ela informa que ainda não recebeu nenhuma resposta aos ofícios enviados.

“Precisamos de mais respostas, mais luz neste assunto. Precisamos saber se houve fraude; se não houve fraude, mas foram detectados erros acima dos aceitáveis; ou se não houve problemas e o laboratório agiu corretamente”. Para isso, a prefeitura está solicitando a revisão de uma amostra representativa dos exames que possa trazer segurança ao processo.

REGIÃO

Em reunião na Azonasul com os prefeitos da região, foi solicitado à Secretaria de Saúde do Estado que monitore os relatórios dos laboratórios que prestam serviços aos pacientes da rede pública. “Pedimos em conjunto que a Secretaria cumpra a sua parte, já que uma portaria do Ministério da Saúde determina que o estado também deve acompanhar o MEQ, Monitoramento Externo da Qualidade, coisa que nunca foi feita, desde 2013. O Estado não faz a sua fiscalização”, disse Paula Mascarenhas.

Por HÉLIO FREITAG JR.

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