Agentes penais do RS denunciam precariedade de condições de trabalho e pedem regulamentação da categoria
Estresse, sofrimento psíquico, ideação suicida, sobrecarga de trabalho, assédio moral, perseguições, punições, falta de equipamento para o exercício das funções laborais, infraestrutura precária e efetivo reduzido, este é o cenário exposto
Estas foram as principais queixas manifestadas pelos representantes dos servidores que participaram, na manhã desta quinta-feira (11), de audiência pública da Comissão de Segurança, Serviços Públicos e Modernização do Estado para debater as condições de trabalho dos agentes penais no Rio Grande do Sul. Convocado pela deputada Luciana Genro (PSOL) e pelo deputado Jeferson Fernandes (PT), o encontro contou com a presença de lideranças estaduais e nacionais da categoria, trabalhadores da segurança e representantes de instituições, mas não teve a participação de nenhum membro do governo do estado.
Por isso, os proponentes da audiência anunciaram que irão insistir para que sejam recebidos, junto com uma comitiva de servidores, pelo chefe da Casa Civil, Artur Lemos. Eles querem entregar ao secretário o relatório da Subcomissão do Sistema Carcerário Gaúcho, documento que contém grande parte das denúncias apresentadas na audiência, e que já foi repassado ao Ministério Público. Além disso, os dois parlamentares deverão procurar mais uma vez o MP para relatar, a portas fechadas, denúncias que, pela gravidade, não foram divulgadas na audiência pública. “A situação é gravíssima. O sistema precisa ser fiscalizado e providências devem ser tomadas com urgência. Estamos num momento em que precisamos da solidariedade de todas as instituições”, pontuou Jeferson.
Luciana Genro considera que as condições de trabalho estão adoecendo os servidores da segurança. “A segurança está adoecida. A organização das carreiras e as condições de trabalho são fatores fundamentais para este adoecimento. Na Brigada, por exemplo, há mais mortes por suicídio do que em confrontos”, comparou.
Para ela, é preciso redimensionar o sistema para garantir dignidade e proteger os servidores não só dos riscos próprios das funções que exercem, mas do assédio moral de superiores.
Sistema penal em números
O documento que será entregue ao chefe da Casa Civil traz os principais números do sistema carcerário gaúcho, além de relatos de seus servidores. De acordo com o relatório, há dez anos, 28 mil presos cumpriam penas em celas, número que passou para 43.800 em 2024. Cerca de 57% dos encarcerados estão em prisão provisória, ou seja, sem sentença transitada em julgado. Tráfico de drogas e crimes contra o patrimônio representam 66% dos delitos praticados por quem está preso no Rio Grande do Sul, seguidos pelos crimes contra a vida (9%) e contra a dignidade sexual (8%).
Ainda conforme o relatório, faltam 5.631 vagas no sistema, que nunca registrou uma atuação tão forte e organizada de facções criminosas.
Presidente do Sindicato disse que já avisou todas as autoridades sobre irregularidades, mas foi ignorado. Foto: Lucas Kloss
SOS
O presidente do Sindicato dos Policiais Penais do Rio Grande do Sul, Sérgio Dessbessell, disse que veio ao parlamento gaúcho pedir socorro em nome da categoria. Segundo ele, o “assédio moral é a forma de gestão”, adotada pela Superintendência dos Serviços Penitenciários. “Todos sabem o que acontece lá. Entregamos as denúncias ao Poder Judiciário, Ministério Público e Secretaria da Segurança, mas foram ignoradas”, revelou.
O sindicalista denunciou também a Corregedoria da Susepe seria rápida para dar prosseguimento às demandas do gestor, mas inerte quando se trata de denúncias feitas por servidores. Além disso, revelou que integrantes do sindicato tiveram a vida privada investigada pela polícia e que os servidores são punidos com transferências, corte de horas extras e ordens para que cumpram tarefas que não estão em suas atribuições legais, como o policiamento ostensivo e ações de busca e apreensão. Mostrou aos deputados ainda o boletim de ocorrência de um colega que foi detido e encaminhado a uma Delegacia de Polícia por “crime de desobediência”, o que, segundo ele, não é previsto para servidores civis. “Esta gestão não sabe o que está fazendo. E quem controla as cadeias não são os agentes. Estamos perto de ver acontecer novamente o que houve há 30 anos, quando o hotel Plaza São Rafael foi invadido por detentos que fugiram do Central. Depois de acontecido, não adianta botar o Batalhão de Choque lá para dentro”, alertou.
Já o presidente da Federação das Polícias Penais, entidade que garantiu a aprovação pelo Congresso Nacional do projeto que criou a Polícia Penal no Brasil, afirmou que a falta de regulamentação da matéria ocorre em outros estados também. Fernando Anunciação lembrou que o projeto tramitou por 20 anos antes de ser aprovado e que o texto final não foi o ideal, mas que traz avanços para a categoria. Ressaltou também que muitas das dificuldades narradas pelos participantes da audiência pública, como a falta de efetivo, ocorrem em outras unidades da federação e que a segurança pública, de modo geral, apresenta demandas reprimidas em todo o país.
Manifestações parlamentares
Deputados de diversos partidos se pronunciaram na audiência, além de terem enviado representantes ao encontro. O deputado Delegado Zucco (Republicanos) manifestou apoio às reivindicações da categoria e disse que aguarda o envio do projeto de regulamentação à Assembleia Legislativa. Afirmou também que considera insuficiente o percentual de reajuste que o governo pretende conceder e que deverá ficar em torno de 4,6% (IPCA), defendendo que o índice acompanhe o grau de produtividade dos servidores da segurança, expresso na redução da criminalidade no RS.
A deputada Delegada Nadine (PSDB) reconheceu que há necessidade de promover avanços em diversas áreas e defendeu, para isso, a busca de convergência entre servidores e o governo. Revelou que o plano que reestrutura as carreiras está sob análise da Procuradoria-Geral do Estado e se comprometeu a pedir agilidade no processo.
Por meio virtual, o deputado Dr. Thiago Duarte (União) defendeu a regulamentação da Polícia Penal e a reestruturação da carreira e anunciou que tem reuniões marcadas com grupos de servidores para debater aspectos dos projetos.
Também participaram da audiência a defensora pública Mariana Py Muniz; promotora Alessandra Moura da Cunha, presidente do Sindicato dos Policiais Penais de São Paulo, Fábio Jabá; presidente do Sindicato dos Policiais Penais de Minas Gerais, Jean Carlos Rocha, além de representantes da OAB/RS e do Conselho Estadual dos Direitos Humanos.