UFPel revoga títulos honoríficos de Doutor Honoris Causa de líderes da ditadura civil-militar no Brasil
A Universidade Federal de Pelotas (UFPel) publicou na quarta-feira (4) a Resolução 112, que revoga os títulos honoríficos de Doutor Honoris Causa concedidos a Emílio Garrastazu Médici e Jarbas Gonçalves Passarinho, líderes da ditadura civil-militar no Brasil
A resolução foi publicada após a reunião do Conselho Diretor (Condir) que decidiu pela cassação dos títulos. A revogação já havia sido aprovada por unanimidade no Conselho Universitário (Consun) em março deste ano. O tema precisava ser apreciado por ambos os Conselhos antes de ser oficialmente publicado como Resolução, conforme os procedimentos administrativos para a concessão de títulos honoríficos da UFPel.
A revogação dos títulos honoríficos ocorreu após um extenso trabalho realizado pela Comissão para Implementação de Medidas de Memória, Verdade e Justiça na UFPel (CMVJ), criada em maio de 2023. A comissão foi formada com o propósito de revisar as honrarias concedidas pela universidade a indivíduos associados à ditadura civil-militar brasileira, com foco particular em aqueles conhecidos por suas violações dos direitos humanos durante esse período.
O relatório do grupo, apresentado ao Conselho Universitário no final de 2023, recomendou a cassação dos títulos honoríficos de Médici e Passarinho. Na mesma reunião, o grupo ficou responsável pela redação da minuta de resolução que foi encaminhada ao Consun para deliberação e publicada nesta quarta-feira (4).
De acordo com o presidente da CMJV, professor Carlos Gallo, com o fim de diversos regimes autoritários, a sociedade passou a discutir a necessidade de medidas de reparação não apenas para as vítimas, mas para a sociedade como um todo. “São medidas simbólicas que demonstram que os atos cometidos no passado não são mais aceitáveis. Elas têm um caráter pedagógico para a sociedade, especialmente quando uma universidade se posiciona contra a manutenção de honrarias concedidas a pessoas associadas a violações dos direitos humanos”, destacou.
A reitora da UFPel, Isabela Andrade, lembrou que o tema foi uma recomendação trazida pela Comissão Nacional da Verdade em seu relatório final, divulgado em dezembro de 2014, além disso o Ministério Público Federal tem cobrado uma posição das universidades sobre o tema. “Em 2023 instituímos a Comissão para implementação de medidas de Memória, Verdade e Justiça no âmbito da UFPel que foi um passo importante que precisamos dar”, disse.
Votando pela revogação das homenagens, a Universidade Federal de Pelotas se junta a outras instituições de ensino superior que adotaram medidas semelhantes. A cassação dos títulos honoríficos visa ser uma das primeiras ações concretas para resgatar a memória das pessoas atingidas por atos da ditadura militar brasileira.
Detentores dos títulos
Emílio Garrastazu Médici (esq.) foi general do Exército Brasileiro. Ocupou a presidência da República de outubro de 1969 a março de 1974. Durante seu governo, houve a difusão dos Destacamentos de Operações de Informações – Centros de Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) pelo território nacional. O período no qual foi presidente é conhecido por ter abrigado um dos maiores picos repressivos da ditadura, que alguns historiadores chamam de “Anos de Chumbo”.
Jarbas Gonçalves Passarinho (dir.) foi coronel do Exército Brasileiro. Apoiou intensamente o golpe de 1964, tendo sido nomeado a ocupar diversos cargos de destaque no período da ditadura, entre eles governador do Pará, senador e ministro do Trabalho, da Educação e da Previdência Social. Foi durante sua gestão à frente da pasta da Educação que foi criada a Universidade Federal de Pelotas.
Ambos já tiveram títulos honoríficos cassados por outras universidades brasileiras, entre elas as Universidades Federais do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Rio Grande do Sul (UFRGS) e Estadual de Campinas (Unicamp).
Comissão Universitária da Verdade e atividades alusivas
A Comissão Universitária da Verdade foi instituída em março de 2024 destinada a ampliar o debate e aprofundar as reflexões sobre a atuação da UFPel durante o período de exceção e os atos ocorridos no contexto da comunidade universitária na época. Desta forma, o grupo segue trabalhando para identificar e documentar eventos e ações relevantes, promover a reparação histórica e estimular uma maior compreensão e consciência crítica sobre o impacto da ditadura militar na universidade e na sociedade como um todo.