Bom senso pode transformar industrializados em aliados
Uma dieta feita apenas com produtos in natura nem sempre é eficiente – o ideal é combiná-los com os industrializados
Uma alimentação saudável é composta tanto por alimentos in natura quanto por produtos industrializados: esta é a recomendação do Guia Alimentar Brasileiro (2014), pensado a partir do ritmo intenso dos grandes centros urbanos e novo comportamento dos habitantes. Porém, por falta de educação nutricional, muitos acabam tendo receio de introduzir os industrializados na dieta, acreditando que o seu consumo resulte no desenvolvimento de doenças crônicas não-transmissíveis, tais como diabetes e obesidade.
De acordo com o cardiologista e nutrólogo do Instituto Dante Pazzanese, Dr. Daniel Magnoni, devemos evitar o seu consumo em excesso, o que não quer dizer que produtos industrializados não possam fazer parte da rotina alimentar: “Temos disponíveis no mercado industrializados que são úteis, seguros e nutricionalmente eficazes. É o caso dos congelados in natura, como verduras e legumes, por exemplo”.
Ainda buscando o equilíbrio, muitos acreditam que uma dieta fundamentalmente in natura seja a mais adequada. Da mesma forma, ela não garante segurança alimentar ou melhor absorção de nutrientes e vitaminas. “Podemos ter uma alimentação 100% in natura e nutricionalmente ineficiente. Ou então comer muitos produtos in natura e não inserir movimento à rotina; o sedentarismo influencia da mesma forma no aparecimento da obesidade, diabetes e hipertensão”, afirma Marcio Atalla, preparador físico.
O fator atividade física, portanto, é muito importante para a reflexão do que é um estilo de vida saudável e como se faz possível a presença dos industrializados na rotina. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad-2017), 62,1% dos brasileiros com mais 15 anos não praticaram qualquer atividade física no ano. Ainda nesse sentido, o gasto de energia do brasileiro caiu aproximadamente 600 calorias nas últimas duas décadas. “O sobrepeso está relacionado a um maior sedentarismo e aumento da ingestão calórica; não necessariamente ao consumo do alimento industrializado isoladamente. É preciso olhar esses outros hábitos que fazem parte do dia a dia”, comenta Dr. Magnoni.
Vários estudos apontam para uma tendência de consumo de mais e mais calorias, menos movimento diário, e, consequentemente, um balanço calórico positivo – não por conta dos industrializados, mas pelo sedentarismo. O último VIGITEL aponta que o brasileiro tem consumido menos produtos industrializados, porém, os índices de doenças crônicas não-transmissíveis continuam crescendo no país. “Tenho certeza de que se observarmos uma pessoa que come pelo menos 40% de industrializados ao dia e que não tem excesso de calorias, ela não terá sobrepeso ou outros problemas de saúde. A chave está justamente no balanço calórico – entre o que se come e o que se gasta”, comenta Marcio Atalla.
Educação nutricional x medidas restritivas
Atualmente, existem propostas em discussão no âmbito governamental que defendem a adoção de medidas restritivas como método eficaz para melhorar a saúde do brasileiro. Ao invés de educação alimentar, defende-se a restrição para influenciar o estilo de vida da população: “A responsabilidade é de várias esferas – do cidadão ao Estado, passando pelas instituições de ensino – e deve levar em conta múltiplos aspectos. Atrelar os problemas da saúde a um fator específico, como o consumo de alimentos industrializados, é tão simplista quanto a adoção de medidas restritivas. A chave para a mudança do estilo de vida está na educação, e isso requer um processo longo de entendimento, conscientização e mudança. Medidas restritivas são imediatistas e já se mostram ineficazes em outras partes do mundo”, confirma Atalla.
Educação nutricional aliada ao incentivo para a prática de atividade física consistem nas melhores ferramentas para promover a saúde da população. “Nesse processo educacional, saber o que se come é uma ferramenta de escolha saudável. Devemos nos atentar aos componentes dos industrializados e empoderar o consumidor para que ele próprio defina o que é melhor para a sua saúde. Ninguém melhor do que ele para compreender o próprio corpo”, acrescenta Dr. Magnoni.
Além de buscar compreender o que está presente no rótulo de cada produto, é importante entender que a dieta é individual – o que é bom para um pode não ser bom para outro. É preciso observar cada pessoa de modo diferente, respeitando carências e excessos, tipos e horários de exercícios físicos, além do estilo de vida de cada um. Tudo isso sem esquecer de se atentar às preferências e gostos alimentares – comida também é prazer. Afinal, um café acompanhado por um biscoitinho não pode fazer mal!