Diário da Manhã

Notícias

Agnaldo Timóteo Voz, rio e estrelas

Agnaldo Timóteo Voz, rio e estrelas
16 outubro
08:16 2025

Marcelo Gonzales*

@celogonzales @vidadevinil

Em 16 de outubro de 1936, nascia em Caratinga, Minas Gerais, um menino chamado Agnaldo Timóteo Pereira. Filho de José Timóteo e Catarina Maria Passos, cresceu entre o trabalho duro e o sonho teimoso de cantar. Vinha de uma casa simples, de chão batido, onde a música era mais promessa que realidade, mas ele acreditava que o destino podia soar como um refrão.

Aos nove anos, vendia bolinhos, engraxava sapatos e carregava malas em estações para ajudar a família. A vida ensinava ritmo e resistência. Com doze, trabalhava com o pai no DNER e, entre um serviço e outro, afinava o desejo de ser cantor. A voz, ainda imatura, já trazia o tom firme e sentimental que mais tarde encantaria o Brasil.

Os primeiros aplausos vieram nas rádios do interior, em programas amadores. Foi ali que cruzou com Ângela Maria, a estrela que o incentivou a tentar a sorte no Rio de Janeiro. E ele foi. No começo, enfrentou hospedagens baratas, promessas vagas e portas que se fechavam. Mas não desistiu. Levava nas mãos uma fé de quem acredita que a voz é o instrumento da alma.

O primeiro disco, Surge um Astro, não poderia ter nome mais profético. Com ele, o país conheceu o timbre intenso e romântico de Agnaldo Timóteo. Vieram os sucessos: Meu Grito, Obrigado Querida, Perdido na Noite. Vieram os palcos, as luzes e um público fiel que se reconhecia naquele canto sofrido e verdadeiro.

Gravou mais de cinquenta álbuns, entre boleros, canções românticas e versões de clássicos estrangeiros. Era presença constante em programas de auditório, especialmente nos anos 70 e 80, quando o sentimentalismo era trilha sonora de quase todas as casas brasileiras. Sua voz não era apenas bela, era confissão, era dor e ternura divididas em notas longas.

Agnaldo, porém, não se contentou com o palco. Quis ser ouvido também na política. E foi. Tornou-se deputado federal e vereador no Rio e em São Paulo. No plenário, falava com a mesma emoção com que cantava. Defendia causas, levantava a voz, colecionava polêmicas e convicções. Viveu acreditando que o canto e a palavra têm poder de mudar destinos.

Viveu intensamente, entre paixões, desacertos e aplausos. Nunca se casou oficialmente, mas teve filhos e amores. Falava pouco sobre a vida pessoal, talvez porque nela morasse o homem que o público nem sempre via, o que duvidava, o que chorava sozinho, o que se via vulnerável diante da própria fama. Apaixonado por futebol, pelo Botafogo e pelo Carnaval, foi homenageado em desfiles e sambas-enredo, porque fazia parte da alma popular do país que tanto amava.

Em 2021, o Brasil vivia dias de incerteza e medo. Agnaldo foi internado com complicações da COVID-19 e ficou 17 dias na UTI. Partiu no dia 3 de abril, aos 84 anos, deixando um silêncio que a própria voz parecia não permitir. Pouco antes de adoecer, havia composto Deus Cuida de Nós (A Epidemia), sua última canção, um pedido e uma entrega ao mesmo tempo.

Seu nome ecoa hoje nas canções que ficaram, nas homenagens e nas memórias de quem o ouviu cantar o amor sem vergonha de ser sentimental. E é curioso pensar que aquele menino de Caratinga, que um dia sonhou apenas em ser ouvido, acabou se tornando uma das vozes mais marcantes do Brasil.

Enquanto escrevo, penso que talvez o segredo de Agnaldo Timóteo tenha sido o de cantar a vida sem pedir licença, mesmo quando ela desafinava. E hoje, neste 16 de outubro, ao lembrar seu nascimento, percebo que o tempo é também uma canção e que algumas vozes, como a dele, continuam soando mesmo depois do fim do disco.

Amanhã, volto aqui. Há outro nascimento, outro som, outro capítulo da história da música esperando por nós no Que Dia é Hoje?.

*Marcelo Gonzales é autor do blog Que Dia é Hoje?, vive entre discos de vinil e muita mídia física, sempre atento à música, à cultura e ao jornalismo, compartilhando histórias que conectam gerações.

Notícias Relacionadas

Comentários ()

Seções