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Coluna de Cinema – Edição 25

Coluna de Cinema – Edição 25
31 março
13:59 2025

Branca de Neve: Um clássico revisitado

A crescente polêmica gerada em torno recente remake live-action Branca de Neve, baseado no clássico desenho animado da Disney, não apenas se mostrou justificada, como antecipou o quão problemático o filme se tornaria. Desde seu anúncio, a produção foi alvo de divisões e discussões acaloradas, tornando-se um símbolo dos conflitos culturais que permeiam a indústria cinematográfica. Agora, com o filme finalmente lançado, é possível afirmar que Branca de Neve não é tão ruim quanto poderia ser, mas está longe de ser bom. No entanto, há algo quase irônico em finalmente assisti-lo após anos de polêmicas — algo como testemunhar um acidente anunciado.

Quando a Disney lançou Branca de Neve e os Sete Anões em 1937, o filme foi um marco histórico: o primeiro longa-metragem de animação dos EUA, consolidando os contos de fadas como parte essencial do império Disney. Quase nove décadas depois, a empresa ainda se agarra a essa fórmula, mas o remake de 2023 – lançado apenas em 2025 (!) – prova que nem toda magia pode, ou deve, ser recriada. Dirigido por Marc Webb (O Espetacular Homem-Aranha) e escrito por Erin Cressida Wilson (A Garota no Trem), o filme tenta modernizar a história, mas acaba preso em uma indecisão entre a fidelidade ao original e a tentativa desajeitada de se reinventar.

As maiores deficiências de Branca de Neve não recaem sobre a atriz Rachel Zegler no papel título, que entrega uma performance competente, ainda que limitada por um roteiro confuso. A verdadeira curiosidade — ou tragédia — está na Rainha Má, interpretada por Gal Gadot (a Mulher Maravilha). Com uma atuação tão afetada que oscila entre o ridículo e o fascinante, Gadot parece não decidir se sua vilã é uma diva do teatro ou uma paródia de si mesma. Seu figurino brilhante e expressões exageradas a tornam mais cômica do que ameaçadora, diluindo a tensão que deveria permear o conto.

Já Branca de Neve, aqui, é uma heroína repaginada para os tempos modernos: evita violência, critica a invasão de propriedade alheia (mesmo quando se refugia na casa dos anões) e repreende seu interesse amoroso, Jonathan (Andrew Burnap), um rebelde que lidera um grupo de bandidos na floresta. A tentativa de subverter expectativas é válida, mas o resultado é uma protagonista inconsistente — nem ingênua o suficiente para lembrar a doce moça do conto original, nem empoderada o bastante para justificar sua reinvenção.

Um dos pontos mais controversos do filme é o tratamento dado aos sete anões. Curiosamente, a palavra “anão” nunca é mencionada, e as criaturas CGI que os substituem parecem mais pequenos hobbits do que personagens com identidade própria. A Disney claramente tentou evitar polêmicas relacionadas à representação, mas a solução encontrada — seres fantásticos indistintos — acaba esvaziando o charme e a importância do grupo no enredo. Eles são relegados a meras figuras de apoio, sem a personalidade marcante que os tornou icônicos em 1937.

Branca de Neve não é o pior remake da Disney — é mais leve e menos pretensioso que Mulan (2020) ou A Bela e a Fera (2017) —, mas também não consegue justificar sua existência. É apenas um conto sem magia, um pecado mortal em se tratando do padrão Disney construído ao longo de décadas e gerações. O filme falha em equilibrar nostalgia e inovação, entregando uma narrativa sem coração, repleta de escolhas estranhas e personagens mal desenvolvidos. No fim, o maior pecado não é ser terrível, mas ser esquecível. E, para uma história que já foi um marco do cinema, esse é talvez o destino mais triste de todos.

Branca de Neve é uma releitura desnecessária, perdida entre o desejo de agradar fãs do original e a tentativa falha de se modernizar. A magia se dissipa antes mesmo do “e foram felizes para sempre”.

Jorge Ghiorzi

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