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Coluna de Cinema – Edição 26

Coluna de Cinema – Edição 26
04 abril
00:22 2025

Presença: espírito voyeur

O diretor Steven Soderbergh surgiu no cinema com o explosivo e polêmico (à época) Sexo, Mentiras e Videotape (1989), um marco do cinema independente que lhe rendeu aclamação precoce. Desde então, construiu uma carreira errática, alternando entre projetos autorais e obras de entretenimento — sempre com traços de inteligência acima da média, mas sem consolidar uma assinatura autoral definitiva. Sua marca, se é que existe alguma a ser destacada, é a versatilidade: um cineasta prolífico que transita entre muitos gêneros, do thriller ao drama, do experimental à comédia, da ficção científica ao policial. Em pouco mais de 40 anos de carreira, Soderbergh já dirigiu mais de 50 filmes, dividindo sua produção entre cinema e TV Neste ano de 2025 já estreou no Brasil seu drama de espionagem Código Preto. Agora, poucas semanas depois, Steven Soderbergh, volta aos cinemas com mais um lançamento: o thriller de horror Presença. Nestes dois trabalhos o diretor repete um de seus vícios mais frequentes: o excesso de estilo em detrimento da substância narrativa.

O filme se apoia em uma história em primeira pessoa, onde a câmera assume o papel de um espírito aprisionado em uma casa vazia. A movimentação peculiar do equipamento não é mero exibicionismo técnico, mas um recurso narrativo que busca fluidez e a ilusão de tempo real — artifício para expressar a percepção da verdadeira protagonista (uma entidade sobrenatural). Diferente de filmes que simulam a ausência do invisível, Presença o torna explícito, quase tangível, guiando a ação como um voyeur ativo. O clima remete a Poltergeist, mas oscila entre o físico e o metafísico, sem mergulhar profundamente em nenhum dos lados.

A trama também esboça uma crítica ao descompasso entre pais e filhos em um mundo hiperdigitalizado, tema relevante, porém tratado de forma superficial. Como em grande parte da filmografia de Soderbergh, há ideias interessantes, mas executadas com frieza emocional. Os planos-sequência — embora eficazes para imersão — tornam-se repetitivos, e a narrativa perde força por conta de uma trama que não consegue sustentar a curiosidade inicial.

Presença é um filme mediano que não oferece uma efetiva experiência significativa, seja como horror ou seja como suspense. A premissa, que empolga nos primeiros momentos, logo se torna redundante, repetitiva e perde seu apelo. Falta consistência na trama e envolvimento emocional para sustentar o interesse. Apesar da técnica precisa e da proposta conceitual válida, a experiência não empolga: falta tensão genuína, desenvolvimento de personagens e um clímax satisfatório. Soderbergh mais uma vez demonstra habilidade como artesão, mas falha em entregar algo além de um exercício estilístico vazio. O espectador fica com a sensação de ter assistido a um experimento formal interessante, porém esquecível.

Jorge Ghiorzi

jghiorzi@gmail.com

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