Coluna de Cinema – Edição 27

Operação Vingança: menos músculos, mais cérebro
O filme de vingança é uma tradição consolidada no cinema, especialmente nos EUA. Desde Joe – Das Drogas à Morte (1970), em que um trabalhador da construção civil (Peter Boyle) declara guerra a uma comunidade hippie, até clássicos como Desejo de Matar (1974), com Charles Bronson no papel icônico que definiria sua carreira, esses filmes compartilham uma mesma gênese: homens que, literal ou simbolicamente, “pegam em armas” para enfrentar injustiças ou um Sistema opressor. Esse subgênero não apenas cativou plateias, mas também ajudou a pavimentar o caminho para a revolução conservadora no coração da América.
No século XX, esses filmes tinham um poder singular — uma catarse coletiva que mesclava justiça popular com um toque de subversão, pois o protagonista, mesmo agindo acima da lei, ainda parecia moralmente justificado. No entanto, em pleno século XXI, em um mundo digitalizado e dominado por efeitos visuais, produções como Operação Vingança (The amateur, 2025) perdem parte dessa crueza impactante. O apelo tecnológico substitui o sangue e o suor, resultando em um entretenimento rápido, fácil e quase indolor — como um videogame.
Dirigido por James Hawes (com larga experiência em séries para a TV e streaming), o filme apresenta Rami Malek como Charles Heller, um analista de inteligência da CIA cuja vida desmorona quando sua esposa é assassinada por terroristas em Londres. Frustrado pela lentidão da investigação e desconfiado de um encobrimento, Heller chantageia seus superiores — incluindo o coronel Henderson (Laurence Fishburne) — para que o treinem como assassino, permitindo que ele mesmo faça justiça. Baseado no best-seller de Robert Littell (já adaptado antes em 1981, com o mesmo título e John Savage no papel principal), o filme oscila entre um thriller de espionagem tradicional e um drama de vingança pessoal.
Diferente dos justiceiros clássicos, o Charlie interpretado por Rami Malek não é um homem de ação brutamontes. Sua arma principal é o intelecto: ele é um estrategista meticuloso, cujo conhecimento técnico compensa sua falta de habilidade com armas. O roteiro evita transformá-lo em um Jason Bourne — ele não atira com precisão, não é um combatente nato, mas aprende sob pressão e necessidade. Essa característica o torna um protagonista mais interessante, ainda que o filme não explore todo seu potencial dramático.
Rami Malek, em seu terceiro thriller de ação e suspense desde o sucesso em Bohemian Rhapsody (os outros foram Os Pequenos Vestígios, 2021; 007 – Sem Tempo Para Morrer, 2021 e Amsterdam, 2022), é a escolha perfeita para o papel. Seus olhos penetrantes e presença introspectiva transmitem a angústia de um geek obrigado a sair da zona de conforto, tornando-o um herói improvável, mas fácil de torcer. Operação Vingança tem momentos genuinamente divertidos, especialmente quando explora a astúcia de Charlie em situações de risco. No entanto, no conjunto, o filme deixa uma sensação de superficialidade. A conclusão, em particular, é pouco satisfatória, como se o roteiro hesitasse entre um desfecho emocionalmente impactante e um final convencional de “missão cumprida”.
Para o público nostálgico dos thrillers de espionagem dos anos 1990, o filme cumpre sua promessa — ainda que sem brilho excessivo. É uma obra competente dentro de seu gênero, mas que, como seu protagonista, parece mais interessada em seguir um roteiro pré-estabelecido do que em surpreender. Operação Vingança é, no fim das contas, um produto ambivalente: honra a tradição dos filmes de vingança com seu protagonista cerebral e um plot que privilegia a estratégia sobre a força bruta, mas falha em transcender as limitações do gênero no século XXI.
Apesar da performance convincente de Malek e de cenas pontuais que capturam a tensão clássica dos thrillers de espionagem, o filme sucumbe à superficialidade do entretenimento descartável — um fast-food cinematográfico que sacia o desejo por ação imediata, mas deixa muito pouco para o espectador após os créditos finais. Seu maior legado, talvez, seja lembrar que, em uma era de justiças algorítmicas e guerras invisíveis, a vingança já não cabe em um simples ato de violência, mas exige perguntas mais complexas que este filme, infelizmente, não se atreve a fazer.
Jorge Ghiorzi
jghiorzi@gmail.com