Diário da Manhã

sábado, 04 de maio de 2024

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NEGROS E NEGRAS : A terra, o território e a territorialidade

16 março
10:01 2015

Dias 20 e 21 deste mês na Câmara Municipal, será realizado o “1º Congresso de Negros e Negras de Pelotas”

Por Carlos Cogoy

O sangue que pulsa nas veias tinha que estar nos olhos. O mundo gosta de pessoas neutras, mas só respeita as que tem atitude. Se não posso mudar o mundo deveria mudar a mim mesmo… Antes que seja tarde. Afirmação do poeta Sérgio Vaz, mencionada pela educadora pelotense Marielda Barcellos Medeiros. Ela integra a organização do 1º Congresso de Negros e Negras de Pelotas, que acontecerá dias 20 e 21 de março no Legislativo municipal. Marielda explana sobre o evento: “Todos os temas são relevantes, mas penso que educação, saúde, segurança, habitação e tradição de matriz africana, são os que irão gerar maior discussão, fruto do que vivenciamos hoje em Pelotas. Participo da organização do congresso e, pela formação e atuação na área da educação, por ter a feliz e gratificante vivência da gestão municipal e estadual nesta área, esta temática possui significado como preferência. Mas penso ser importante estar participando de todas as discussões, pois todas estão intimamente relacionadas a nossa vida cotidiana, não tendo como ficar de fora. E considero que as deliberações que iremos construir, a partir do tema central, ‘Terra, Território  e Territorialidade’ serão fundamentais para encaminharmos ao Executivo e Legislativo local.  Trata-se de panorama das questões que serão discutidas, e estão relacionadas com a população negra da cidade. Já o impacto se dará a partir da apresentação da realidade vivida e cobrança efetiva de ações. Em muitos discursos políticos se ouve que o racismo é uma questão social, se é, cabe aos gestores enfrentá-lo e é isto que vamos buscar”.

Marielda (terceira da esq. à direita) foi assessora da educação para as relações étnico-raciais

Marielda (terceira da esq. à direita) foi assessora da educação para as relações étnico-raciais

FORTALECIMENTO – A educadora avalia o desafio da perspectiva democrática de debate com diferentes vertentes do movimento negro: “Temos debatido muito ao longo dos nossos encontros de organização, que o momento é para fortalecermos nossa identidade enquanto negros e negras, mobilização coletiva que irá debater e refletir sobre questões relevantes, importantes para a população negra da nossa cidade. Admitimos sim, as diferenças ideológicas e partidárias, mas temos a plena certeza que estas só nos enfraqueceram. O congresso, e é um dos pontos que pretendemos avançar internamente, será a superação das nossas diferenças em prol de algo maior, a defesa da nossa história, nossas origens e nossa tradição africana. Assim, seguindo as palavras de Milton Santos: ‘Que a trança do cabelo ou o cabelo espichado não sejam um dado que exclua ou separe. Que cada um, como é, encontre seu lugar nessa luta’. Seremos todos Ubuntu: ‘Sou quem sou, pelo que nós somos’”. Marielda também salienta que o congresso será concluído no sábado 21 quando, internacionalmente, transcorrerá o dia de luta contra a discriminação. A data que até então não recebia muita atenção em Pelotas, originou-se de massacre em Shaperville na África do Sul. A 21 de março de 1960, negros protestavam contra a “Lei do Passe” – restringia os deslocamentos e acessos a bairros -, quando foram violentamente reprimidos pelo Apartheid. Houve 69 mortos e 180 feridos. Oito anos depois a ONU instituiu o Dia Internacional contra a Discriminação Racial.

RACISMO – Pelotas e País com trajetórias racistas. Marielda opina: “Não vou aqui observar com muitas palavras o mesmo que muitos relatam. Mas, vivenciando o cotidiano de Pelotas, torna-se simples afirmar que vivemos numa cidade racista, preconceituosa e discriminatória. Penso que nós, pelotenses, tenhamos que olhar para nossa cidade e para nós mesmos. No País já avançamos, e isto é fruto da luta do movimento negro político organizado. Atualmente já admitimos que não vivemos numa democracia racial, e também dispomos de algumas políticas afirmativas como as cotas. Mas, para avançarmos, temos de assumir como nação e, como disse Joel Rufino dos Santos: ‘A escravidão – que durou os quatro quintos iniciais da existência brasileira – não é a origem do racismo: ela é o racismo’”.

Educadora Marielda Medeiros desde adolescência atua no movimento negro

Educadora Marielda Medeiros desde adolescência atua no movimento negro

RESISTÊNCIA – Em relação a definições do Congresso, a educadora frisa que “no sábado iremos construir documento que será encaminhado ao Executivo e Legislativo municipais. No documento serão pontuadas as questões que considerarmos urgentes de intervenção. Também, é proposta desde o começo da organização do congresso, continuarmos vigilantes e cobrando que as intervenções se efetivem na prática, beneficiando a comunidade local. O congresso será um momento que coloca a história da luta negra em Pelotas, como mais uma forma de resistência, que em vários momentos serviu de referência para outros municípios não só da região sul, mas do Estado, portanto, deve se tornar sim, motivador para outros segmentos”.

TRAJETÓRIA – Em 2013 e 2014, Marielda foi assessora da educação para as relações étnico-raciais da SEDUC/RS. De 2011 a 2014, assessora da equipe da diversidade da 5ª CRE. Entre 2001 e 2004, supervisora do departamento pedagógico da atual SMED. No mesmo período, integrou o Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do RS (CODENE). No Colégio Pelotense atuou como professora na educação infantil, séries iniciais e curso Normal. Também foi coordenadora pedagógica do ensino fundamental séries iniciais. Em 2010, premiação no CEERT de São Paulo, com o projeto “Nem chá, nem café: degustamos história e cultura negra”. O trabalho foi desenvolvido junto a alunos da Escola Louis Braille. Ela menciona que o início da militância foi aos catorze anos, estimulada pela mãe, ao participar dos agentes pastorais negros. Mestranda em educação, Marielda foi fundadora do grupo Odara. Atualmente atua no Núcleo de Educadoras e Educadores Negros (NEEN).

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