Diário da Manhã

Por Carlos Cogoy

Ela reside em Passo Fundo. Mas é pelotense, e cursou letras na UFPel. Na cidade natal, trabalhou como professora de inglês numa escola de idiomas. Posteriormente, período nos Estados Unidos. Ao retornar ao Brasil, há vinte anos, mestrado em teoria literária na PUC/RS. Docente na Universidade de Passo Fundo, cidade na qual foi morar com a família, também tem se dedicado a traduções, e atividades como intérprete e mediadora cultural. Luciana também produziu o documentário “Amor Animal”, lançado há três anos. Em 2015, publicou o livro “No Coração da Floresta”. Nesta terça, retorna à cidade natal para participar da programação da 45ª Feira do Livro. Às 19h na Praça Cel. Pedro Osório, Luciana Lhullier estará autografando “A Casa de Dentro e Outras Loucuras”. O livro está à venda na banca da Livraria Vanguarda. Na internet: acasadedentro.com.br

Autora pelotense Luciana Lhullier

AUTENTICIDADE – Luciana observa sobre a literatura: “Sou contadora de histórias, e minhas histórias têm sempre muitas camadas, entrelinhas e questões. Não acredito numa literatura que dê muitas respostas. Acredito que a literatura deve provocar perguntas, dúvidas e questionamentos. Se o escritor tem algum compromisso, é o de ser honesto em relação às suas convicções, bem como em relação aos leitores. Em relação à literatura infantil, não gosto de armadilhas, de histórias que pretendem dizer ao leitor o que é correto ou como deve se comportar. Para escrever às crianças, o escritor tem que usar a voz de sua própria infância e, para isso, tem que ser capaz de se mostar verdadeiramente. Não simpatizo com autores que escondem e emudecem sua própria infância, por mais dolorosa que a mesma tenha sido”.

SUBJETIVIDADES – A escritora cita autores ficcionais que admira: “Borges; Neil Gaiman; Terry Pratchet; Ray Bradbury; Ursula Le Guin; Marina Colasanti; Angela Carter. Gente que, principalmente, entende a importância da fantasia”. E acrescenta: “Não há criação sem subjetividade, até mesmo para quem se diz realista. Todo e qualquer processo criativo tem que passar pela subjetividade do autor ou do artista. E o engraçado é que até aqueles que tentam evitar a subjetividade a qualquer custo, paradoxalmente, acabam se mostrando na tentativa de se esconder. Não tem jeito. Se você pensa que pode fazer arte, ou literatura, sem se mostrar nem um pouquinho, é melhor tentar fazer outra coisa, porque é inevitável”.

FAMÍLIA – Prima da pesquisadora, escritora e professora, Yolanda Lhullier dos Santos – co-autora de “Francisco Santos – pioneiro no cinema do Brasil” -, Luciana conta que a leitura integrava o cotidiano familiar: “A leitura e as histórias, de modo geral, sempre foram muito presentes na minha casa. Todo mundo lia. E todo o material de leitura estava à disposição de todos. Claro que cada um tinha suas preferências. Como caçula e temporã, muita coisa que eu tinha foi herdada dos meus irmãos, ou eu pegava do quarto deles por curiosidade. Meu avô materno, Edmundo Cardoso, também era uma grande influência, com seu entusiasmo pelo conhecimento. Aventura, fantasia, ficção científica, terror e mistério sempre foram as minhas paixões. Li de tudo um pouco. Em relação a escritores pelotenses, não há como não mencionar Simões Lopes Neto, cuja obra li toda. Sua força narrativa aliada à simplicidade de conteúdo é magistral. O Boi Velho, por exemplo, me toca até hoje. ‘Cuê-pucha…é bicho mau o homem’, para mim é, ao mesmo tempo, uma análise social ainda muito válida nos dias de hoje. Além disso, uma denúncia de como é fácil esquecermos de que somos também animais”.

Obra para leitores de todas as idades

A Casa de Dentro e Outras Loucuras, publicação independente de Luciana Lhullier, tem ilustrações de autoria de Giulia Citollin, Guilherme Silveira, Vagner de Freitas Pires e Daniele Stuani. A autora menciona: “’A Casa de Dentro e Outras Loucuras’ é dedicado às crianças pequenas que dão os primeiros passos em direção ao caminho de casa, e às crianças grandes que tantos caminhos percorreram e, muitas vezes, precisam retornar ao lar. É uma coleção de histórias, ou mini contos. E não é uma viagem interior, no sentido de não ser auto-biográfica, mas sim tem elementos subjetivos e mostra um pouco da autora, senão, não seria literatura, ou arte, em um sentido mais amplo. Então, loucuras no sentido de ousadias, transgressões, desafios e propostas de outros caminhos. A imaginação e a criação são as grandes ferramentas que nós temos para lidar com nossos monstros internos e externos”.

SENTIMENTOS – Luciana salienta: “O mais longe e o mais perto. O lugar mais bonito de todos. Qual caminho você percorreria para descobrir a sua própria história? No livro apresento uma coleção de ideias fantásticas, que tocam de forma livre e imaginativa o que há de mais profundo no ser humano: os sentimentos. Ensinamentos dos pais, mulheres com asas, Lady Sapo, Lorde Bigodes, e as árvores que acarinham são apenas algumas joias literárias que apresento em palavras, e ganham traço e cor nas imagens feitas pelos ilustradores passofundenses”.

ESCOLA e leitura. Luciana avalia: “O que se observa é a escola tentando dizer aos jovens, que leem, e muito, que eles não leem, e que leitura é um ‘remédio que eles têm que tomar porque vai fazer bem’. Escutar os jovens, deixá-los falar sobre o que lhes interessa, tentar compreender sua realidade e, principalmente, estimulá-los a formar grupos de leitura a partir de suas próprias escolhas. Só um leitor consegue formar outro leitor”.