Diário da Manhã

sábado, 23 de novembro de 2024

Notícias

Pedro Simon completa 91 anos e analisa atual momento político

03 fevereiro
08:48 2021

“Faço uma reflexão, inclusive de fé. Me equacionei, olhei para trás”

Por Carla Garcia

O ex-senador Pedro Simon completou 91 anos em pleno isolamento social e faz uma análise sobre o seu atual momento, sobre política e sobre as perspectivas para o Brasil, para o Rio Grande e para o MDB

Protagonista da história, líder máximo do MDB gaúcho e um dos políticos mais respeitados do País, o ex-senador Pedro Simon – em isolamento social há cerca de um ano por conta da pandemia de Coronavírus – completou 91 anos em profunda reflexão.

Com muita saúde e disposição, Simon nos brinda, na data do seu aniversário, 31 de janeiro, com uma análise sobre a vida, a política e as perspectivas para o futuro do Brasil e do Rio Grande do Sul.

Em sua residência em Rainha do Mar, no Litoral gaúcho, ele recebeu a nossa equipe para essa Entrevista Especial ao site do MDB-RS.

Neste domingo, 31 de janeiro, o senhor completo 91 anos de vida. Neste período sempre teve uma agenda ativa, com todos os mandatos e depois com palestras pelo Brasil. Agora, em isolamento social, como tem sido os seus dias?

Neste domingo fiz 91 anos e, em toda a minha vida, desde os 13 para 14 anos, nunca parei. Desde os tempos do Colégio do Carmo, lá em Caxias do Sul, quando eu era um gurizinho, baixinho, pequenininho, andava por lá, todo rasgado… mas de repente teve um concurso de oratória e disseram para me colocarem para falar. E eu tirei o segundo lugar. Em primeiro ficou o meu grande amigo Bisol (ex-senador José Paulo Bisol), que discursaria na Semana da Pátria. Mas ele acabou ficando doente e eu discursei. Comecei neste episódio e nunca mais parei (risos). Dali para frente, nunca soube o que era parar.

“Faço uma reflexão, inclusive de fé. Me equacionei, olhei para trás”

E agora teve uma oportunidade forçada…

Durante toda a minha vida eu sempre quis parar um tempo para refletir, mas nunca tive essa chance. Fui dirigente estudantil, vereador, deputado quatro vezes, senador quatro vezes, governador, ministro, e nunca tive um dia sem mandato, nunca tive um dia de folga. E de repente parei. E eu sempre tive vontade de parar. E como eu sou da Ordem Terceira de São Francisco, tinha pensado em passar um tempo num país da África, num destes com língua portuguesa, para fazer um retiro e um trabalho de assistência social. Estava tudo certo, mas recebi a orientação de que deveria ficar na nossa embaixada. Então desisti, pois esse não era o me propósito…passear na embaixada. E não fui. Mas não é que esse ano, com esse problema de saúde, estou aqui em Rainha do Mar há um ano refletindo? Analisando? Uma reflexão inclusive de fé. Me equacionei. Olhei para trás.

Alguma lição?

Me lembro lá em Caxias do Sul, ainda menino…tive um problema com um grande amigo meu, uma discussão. Ele havia sido acusado injustamente por algo que não fez. E naquela oportunidade não dei a ele o apoio que deveria. Sessenta anos depois eu liguei para esse amigo e foi uma alegria ouvir a emoção dele. Ele disse: “Pedro, tu não calcula o bem que está me fazendo! A mágoa que eu tinha estes anos todos”. É interessante isso!

E que conclusões o senhor tira destas reflexões?

Sob o ponto de vista pessoal, acho que fiz o que podia fazer. Não sei se poderia ter feito mais. Eu vivi horas dramáticas na minha vida. Era deputado há um ano, pois me elegi em 1963, e um ano depois veio a Ditadura Militar e as cassações. No segundo mês do novo regime eu já era líder da Bancada do meu partido, e não por qualidade, mas porque cassaram praticamente todo mundo. Foi prisão, cassação, violência, morte e tortura. Parece piada, mas esse período começou em 64 e terminou logo ali atrás, quando conseguimos eleger o Doutor Tancredo (Tancredo Neves, eleito presidente do Brasil em 1985). E ele não assumiu. E se formos analisar a história do Brasil, não houve um período tão frio, drástico e brutal como o de 64, até ontem.

Naquela época, como líder político gaúcho, o seu nome se tornou referência nacional e trouxe o debate para cá…

Me lembro naquela época, a revolução, a igreja católica com as caminhadas “Deus, Pátria e Família”, e com todo aquele contexto, a gente conseguiu resistir. Aqui no Rio Grande do Sul, de modo muito especial, a Assembleia Legislativa teve papel fundamental. Eu como presidente do partido e o Forster como presidente do IEPES (André Foster, então presidente do Instituto de Estudos Políticos, Econômicos e Sociais). Fizemos a grande caminhada que foi adiante. Um episódio que sempre lembro foi quando a Ditadura fechou o Congresso Nacional e todas as Assembleias Legislativas do Brasil, menos a do Rio Grade do Sul. Então, com tudo fechado, política só se fazia em Porto Alegre. Fizemos um grande congresso das oposições e traçamos um rumo.

 

Agora falando um pouco do Brasil atual. Há um ano o senhor dizia que o presidente Jair Bolsonaro tinha tomado duas decisões importantes ao formar o seu governo: indicar Sérgio Moro e Paulo Guedes para ministros. E hoje, como o senhor avalia o governo?

Eu falava que o senhor Bolsonaro tinha tomado duas posições que eu respeitava. Pegar o Moro (Sérgio Moro, ex-juiz símbolo da Operação Lava-Jato e ex-ministro da Justiça), líder do combate à corrupção e colocar de ministro e dar a ele plenitude para fazer tudo o que fosse necessário, achei sensacional. Mas o que aconteceu? Não vejo hoje o presidente preocupado com o combate à corrupção. Tem uma encenação, essa coisa toda, mas preocupação em apurar, não vejo. E o outro que também falei, que achei positivo, foi o ministro Paulo Guedes. Antes dele nunca havia uma posição clara no tema da economia. Todas as questões que envolviam a economia tinham confusão. E o Guedes apresentou, e justiça seja feita, tirou até o status de ministério das outras pastas e os titulares passaram a ser secretários que respondem a ele. Começou bem, mas agora é uma figura quixotesca o ministro da economia, está esvaziado.

O tema do impeachment novamente voltou à cena. O que o senhor acha disso?

Eu vejo com muita tristeza estes movimentos pedindo o impeachment do presidente, até porque temos que meditar muito, isso não pode ser todo dia, um dia sim, outro dia não. E parece que o presidente incentiva estes movimentos de brigar com o Congresso e com o Supremo, mas se saísse o presidente, quem assumiria? O vice-presidente? Um general de quatro estrelas? Mas eu peço a Deus que ele vá adiante, bem ou mal, mas que leve esse governo até o fim. Mas na verdade, o Supremo (Supremo Tribunal Federal – STF) tem algumas interrogações em relação a ele. E o presidente tem essa atitude confusa. Falou que era contra a corrupção, disse que ia acabar com o “toma lá, dá cá” e agora namora com o centrão, onde estão os grandes problemas do Poder Executivo.

Nestes tempos de embates ideológicos, o mundo foi surpreendido por atos antidemocráticos nos Estados Unidos, o que acabou refletindo por aqui e motivando declarações do presidente, como a frase: “Quem decide se um povo vai viver em uma democracia ou em uma ditadura são as forças armadas”. O senhor acha que nossa democracia pode estar ameaçada?

Apesar de todos os pesares, a nossa democracia vai se manter. Eu creio que o importante que nós temos é a necessidade de entrosamento, de entendimento e de respeito recíproco das pessoas, de realmente olhar para frente. Agora, tem um aspecto negativo, estamos hoje com 40 partidos, isso é uma loucura. Uma reunião de líderes, com 40 líderes, não é uma reunião, é um Congresso.

Por falar em Congresso. Que atitude o senhor espera dos novos presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados?

Um presidente tem que ser uma figura independente. O objetivo deve ser o que é bom para o Brasil. Então as grandes reformas, as grandes transformações, os grandes projetos devem ser votados com independência. Deve ter a grandeza de ver como é, e buscar o melhor caminho.

E quais são suas perspectivas para as novas eleições presidenciais em 2022?

Não me parece que essa altura o debate de esquerda ou direita seja o fundamental. O fundamental é que o Brasil é um país que precisa crescer e desenvolver e que o programa da dignidade e da correção tem que continuar e ser passado a limpo. A gente está perdendo tempo, batendo o pé, e é necessário coragem para levar esse país adiante.

E o MDB neste cenário?

É preciso fazer uma profunda reflexão e trazer um nome que tenha alta representatividade e fazer uma frente, uma bandeira, as teses que queremos e entrar no debate. Até é bom que não se tenha um candidato marcado, porque poderemos fazer um debate de contexto geral e adiante a gente vai ver quem é que sai.

Fim da prisão após condenação em segunda instância: o STF deu um passo atrás e mudou a interpretação. Agora a pauta está parada no Congresso há mais de um ano. O senhor acredita que essa guerra está perdida?

Não sou derrotista, mas não sou otimista. Se passar a ser como era, e voltou a ser agora, é condenado em primeira, segunda, terceira, quarta instância, até chegar ao Supremo. Só se vai para a cadeia quando houver condenação definitiva, mas nestes casos políticos de corrupção nunca houve condenação fina e está começando a voltar isso. Mas se não tiverem coragem de fazer isso agora, mais tarde o Brasil fará.

E o senhor como grande defensor da democracia, como tem visto a livre expressão nas redes sociais?

Eu vi desde o início com simpatia as redes sociais, no sentido de aglutinar pessoas para uma causa. Agora, eu não cogitava tanto de fazer um mar de redes sociais e elas terem à frente um comando que usa a rede para maquinar coisas contra A ou B. Aí é uma coisa que tem que analisar. Mas continuo achando que as redes sociais são importantes. E hoje tem uma coisa interessante, aquele monopólio que tínhamos até quatro anos atrás, de uma empresa de televisão dizer algo e virar lei, não acontece mais. Ela pode até continuar dizendo, mas hoje todo mundo debate e contesta.

Falando um pouco do nosso partido aqui. O MDB saiu vitorioso das urnas em 2020. Esse resultado deve se refletir na eleição para o Governo do Estado?

O MDB do Rio Grande do Sul tem uma história bonita, de luta, de resistência. O MDB coordenou a grande campanha nacional pela Anistia, Diretas Já, retomada da democracia e Assembleia Nacional Constituinte. Posso dizer que em Porto Alegre fizemos uma aliança de companheiros que se abraçaram, e a candidatura do Melo (Sebastião Melo, prefeito da Capital) foi muito importante. O Melo é um grande nome, um grande líder, tem uma história. Veio de Goiás para cá para encontrar uma fórmula de sobreviver. Começou carregando legumes na Ceasa, foi com firmeza, cresceu, desenvolveu, se formou…é um líder autêntico e identificado com o povo e com a sociedade. Junto com ele, fizemos prefeituras importantes, um número expressivo de vereadores, temos nossos deputados. Temos nossa história e um partido forte para assumir grandes desafios.

Na sua opinião, qual deve ser a bandeira do MDB na próxima campanha?

O Alceu (deputado federal Alceu Moreira) está na presidência do partido e está tendo uma boa atuação. Acho que agora em março o partido e a Fundação Ulysses Guimarães têm que fazer esse debate. Preparar com muito carinho e com muito afeto.

Notícias Relacionadas

Comentários ()

Seções