EDUCAÇÃO : Escola de Canguçu é referência no País
A experiência “Multiplicando saberes e pensamentos”, que iniciou em Canguçu já chegou a escolas do Maranhão
Por Carlos Cogoy
Famílias de agricultores e comunidade quilombola, residentes no 4º distrito de Canguçu, localidade de Rincão dos Marques, tornaram-se protagonistas de ensinamentos ministrados na Escola Municipal Gonçalves Dias. Há quase dois anos, através do projeto “Multiplicando saberes e pensamentos”, moradores e comunidade escolar, passaram a interagir em aspectos como a “interdisciplinaridade e construção da memória”. Para a formação pedagógica diferenciada aos professores, encontros foram viabilizados através da parceria entre a Secretaria Municipal de Educação e a empresa Safra Remix. Como objetivo, informa a secretária de educação Ledeci Coutinho, abordagens acerca da “Teoria dos campos conceituais”. Além disso, a escola recebeu maquinário que agiliza a reprodução de cópias. A teoria e o instrumento de trabalho, geraram a criação do jornal “A Toca da Onça”.
ILHA – Comunidade e escola, durante décadas, permaneceram distantes. A professora Berenice Machado, integrante da comunidade quilombola de Passo do Lourenço, e ministrante das disciplinas de artes e língua portuguesa, comenta sobre a falta de interação: “Era como se não fizéssemos parte do mesmo espaço. A conexão entre os moradores da região e a instituição de ensino ocorria apenas por meio dos filhos de agricultores em idade escolar. Cessado esse período, a escola voltava a ser uma ilha fechada à riqueza imaterial de saberes daquela localidade”.
JORNAL “A Toca da Onça” levou os alunos a conhecer e divulgar a comunidade. Conforme a diretora Paula Jacondino: “Eu tinha o sonho de que a escola se transformasse num lugar onde os alunos gostassem de vir, que fôssemos além da produção de textos e das fórmulas matemáticas. E hoje percebemos que isso realmente aconteceu”. Já a educadora Liziane Aquino, professora de língua portuguesa, observa: “Percebemos na prática a função social da escrita. Tu não escreves para que o texto morra na pasta do professor ou retorne simplesmente riscado. Escreves para ser lido. E o nosso texto, que estava na sala de aula, de repente chegou à comunidade. De repente chegou a Brasília. Daqui a pouco ganhará o mundo, porque o céu é o limite”. A secretária Ledeci acrescenta que os relatos dos quilombolas aos alunos, podem contribuir para aulas sobre a história da África.
PRÁTICA – “A partir da formação pedagógica nas oficinas de escrita criativa e leitura com compreensão, os saberes, as aprendizagens e os pensamentos tomam forma. Construída a partir de eixos temáticos, cada edição do jornal destaca um tema específico. A publicação vai além da linguagem escrita, agrupando a maior diversidade possível de áreas do conhecimento. Reportagens, fotos, charges, crônicas, poemas e gráficos dividem espaço com dados sobre educação ambiental e estatística, mostrando que a matemática pode ir muito além das fórmulas, e se conectar às vivências de cada estudante. Houve edição na qual os alunos apresentaram gráfico evidenciando a redução no índice de reprovação, em especial no sexto ano. As matérias de cada edição são construídas de forma coletiva. De câmera e gravador em punho, pequenos repórteres percorrem comunidade em busca de informações. Sem perceber, a cada construção textual, os jovens estão construindo também a própria história e a memória daquela comunidade”, diz a única secretária de educação negra no Estado.
BRASÍLIA – Ano passado, a escola recebeu a visita de Paulo Gabriel Nacif, secretário de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) do Ministério da Educação (MEC). Conforme Ledeci Coutinho, ele deslocou-se de Brasília especificamente para conhecer o projeto na escola Gonçalves Dias. Ele salientou que estava diante de uma “comunidade educadora”, e a experiência poderia ser aplicada noutras regiões do País. Na ocasião, o representante do MEC foi entrevistado pelas alunas Caroline e Larissa, e sua presença foi divulgada em edição do jornal escolar. No decorrer de 2015, também as escolas Marechal Floriano e Castelo Branco, passaram a desenvolver o projeto. Neste ano, escolas do Maranhão também começaram o trabalho.