EDUCAÇÃO : O futuro da escola no contexto digital
A cultura midiática provoca mudanças na aprendizagem, desafia a prática docente, e contrasta com a escola tradicional
Por Carlos Cogoy
Alunos que não conseguem desligar o smartphone. Professores que se desdobram para conseguir atenção em sala de aula. Jovens impacientes diante da didática que centraliza o saber no professor. Práticas pedagógicas desafiadas pelas inovações tecnológicas. Estudantes que resistem à leitura do livro impresso, mas são incansáveis na descoberta de aplicativos. Educadores ávidos por alternativas eficazes, que motivem os discentes, e estimulem a aprendizagem. O impasse tem se aguçado na educação escolar e, para quem não acredita na mudança, o cenário se mostra cada vez mais irreversível. Sobre o futuro da escola no contexto digital, professor dr. Luis Otoni Meireles Ribeiro (IFSul), proferiu a palestra “Tecnologias na Educação”. Ele foi um dos convidados do “3º Seminário Municipal: Perspectivas da Educação”, promoção da Secretaria Municipal de Educação e Desporto (SMED).
ESCOLA – No auditório do Colégio Municipal Pelotense, o professor Luis Otoni observou: “A cabine de um trator tem aparato tecnológico. Nas mais variadas profissões, o médico, engenheiro e atletas, a tecnologia está presente. Um taxista, por exemplo, melhora o desempenho profissional se contar com aplicativo para recebimento de chamadas. Além disso, localiza-se com agilidade através do GPS. Nenhuma profissão, então, consegue aplicação mais intensa, sem o uso de tecnologia. Mas, e a docência, a realidade da educação, o contexto da escola? Ora, estamos numa nova cultura digital que, fora dos muros da escola, pulsa intensamente. No cotidiano, consumimos mídia. Porém, ao entrar numa escola, é como se fôssemos transportados numa máquina do tempo. E é vedado o contato com a informação. O ambiente ainda é tradicional. Mesmo multiplicando-se as possibilidades tecnológicas na escola, com os laboratórios de informática e a lousa digital, a prática ainda é limitada, baseando-se nos recursos de outra geração. Alguns professores usam os computadores, como se estivessem manuseando os antigos retroprojetores. Em muitas escolas, os laboratórios de informática, permanecem ociosos. Muitas vezes solicitamos recursos e capacitações, mas não os usamos nem participamos dos eventos. No Paraná, recentemente, foram localizados equipamentos que permaneciam embalados, e não chegaram a ser usados”.
MUDANÇAS – De acordo com o docente do IFSUL, há inúmeras experiências que demonstram mudanças na área da aprendizagem. A exemplo, salas de aula com “layouts” que, através das mesas de trabalho, estimulam a interação com o conhecimento. Atualmente, fala-se no conceito de “sala de aula invertida”. E o docente exemplifica com a Universidade de São Paulo (USP), onde em muitas salas já não há o quadro, tampouco o professor permanece na postura tradicional diante dos alunos. Ele compara que, na educação tradicional, o conteúdo é ministrado, e a tarefa corrigida. Já na sala invertida, o aluno deixa a passividade, pesquisa, e é estabelecido repertório. Na sequência, mediante questionamentos, contexto dialógico e interativo.
Aprendendo com o dispositivo móvel
Em países como o Canadá, que antes interrompiam aulas devido a nevascas no inverno, a sala de aula tanto conta com alunos presentes, quanto também “remotos”. O aluno, em casa, assiste as aulas. Manifestação do professor Luis Otoni Meireles Ribeiro, que ressaltou o quanto a realidade digital está em permanente mudança. Em cinco anos, conforme expressou, celulares e notebooks proporcionaram muitas transformações no cotidiano. Atualmente, afirmou, 90% do acesso à internet no Brasil, ocorre através da computação móvel. “Nem percebemos, mas o celular de hoje, ou até mesmo o computador de alguns veículos, têm a mesma capacidade dos então ‘poderosos’ computadores 386 e 486 dos anos noventa. Em muitas cidades, expandem-se áreas com acesso gratuito à conexão sem fio. Nos aparelhos domésticos, também a tecnologia tem sido aprimorada, e muitos comandos podem ser operados diretamente do celular. Atualmente, está potenciamente excluído, o adolescente que não dispõe da tecnologia para o encontro com os amigos. O celular está cada vez mais barato, e quem passa mais de duas ou três horas sem acessar o dispositivo móvel? O celular, então, pode ser parceiro do estudante”, disse.
GERAÇÃO WEB 2.0 – O professor Luis Otoni acrescentou: “O jovem aprende melhor quando se aproxima do conhecimento, recorrendo a método que confia. É engano pensar que o professor será substituído. Na verdade, o protagonismo é que será dos estudantes, que estarão operando sobre conteúdos. Muitas vezes, acessando o YouTube, o aluno encontra explicações mais ágeis e objetivas, do que os tópicos transmitidos durante a aula. Ao invés de fornecedor direto de conhecimento, o professor então, será um animador da inteligência coletiva. O aluno chega com informações e, para o professor, concorrer com o ambiente digital, seria uma grande desvantagem. Obviamente que há diferentes realidades, e alguns já dispõem de acesso há mais tempo, com mais qualidade, enquanto outros jovens ainda não tiveram as mesmas oportunidades. Diante disso, é necessário estimular uma ‘convergência digital’, proporcionando integração de mídias, ou seja, convergindo para interagir num único ambiente. Numa aula na UCPel, a professora Raquel Recuero, que pesquisa o contexto digital, observou que os alunos estavam debatendo o tema nas redes sociais. Ela então tratou de projetar o debate, e o grupo todo acompanhou as manifestações que estavam sendo trocadas. Ora, nossos alunos são nativos digitais, e têm desenvoltura. Conforme a perspectiva conectivista, o ambiente serve para expandir inteligência. Em rede somos mais, do que quando estamos isolados”.
Vídeos e seminários
Estratégias pedagógicas para estimular a aprendizagem dos estudantes. De acordo com o professor Luis Otoni, a escola deve deixar de ser dicotômica. Assim, aberta à experimentação, incerteza, erro e fracasso. “Até quando persistirá o esforço de resistência, que torna a escola um mundo à parte do contexto midiático?”, questiona. Entre as sugestões do docente do IFSul, estímulo à produção de vídeos, bem como a prática de seminários, que desafiam o aluno à apreensão de conteúdos, exercitando a capacidade de síntese.
VÍDEOS – Conforme Luis Otoni, a questão não é ensinar, mas “como se aprende”. A nova geração, argumenta, não tem paciência para 1h30min de vídeo. No entanto, encanta-se com o professor que produz mídia. Porém, muitos professores ainda se constrangem, ou não se permitiram experienciar o recurso que agrada a boa parte dos estudantes. Mas, compara, cada um de nós está conectado, e procura na internet desde uma receita até as mais variadas dicas. Segundo ele, não há necessidade de estúdio, mas disposição para compartilhar saberes. Conforme mencionou, os alunos podem ser estimulados através de diferentes estratégias. A exemplo, apresentar em três slides uma temática como o trabalho infantil. Acontece o estudo sobre o tema, e é provocada a perspectiva de síntese para a transmissão. Numa aula de idioma, conforme a música estudada, o grupo poderá ser desafiado a reunir série de imagens que informem sobre a letra. Outro recurso mencionado, foi o “simulador”, que pode ser baixado e, em diferentes áreas, desafia o jovem a se superar. Já os seminários são experiências que contribuem com a apropriação, compreensão e criação.
PROFESSOR – No contexto digital, ao invés de quatro paredes, a escola se torna ambiente para “espaços de experimentação”. A avaliação, sugere Otoni, deve ser processual. Na cultura de convergência, acontece a produção e compartilhamento de conhecimentos. O conteúdo deve ser apresentado, conforme a necessidade do público, ponderando dificuldades, linguagem, formato e enfoque. O papel do professor deve ser “menos expositivo, mais dinâmico e participativo, instigando a aprendizagem autônoma, fomentando a socialização e aprendizagem colaborativa. Assim, educação crítica, gerando espaço de prática pedagógica, mediando conflitos e experiências”.