Atelier comunitário para reuso de tecidos
Por Carlos Cogoy
Atualmente ela elabora figurino para o show dos músicos Zé e Tatu – José Menna e Tato Ribeiro. Na agenda também a criação de peças para o espetáculo “Palco de Feiras” que integrará o festival “Teatrua” em outubro. No cotidiano segue a confecção de roupas personalizadas. Conforme expressa, para “mulheres de atitude”. Algumas de suas criações, além da cidade natal, seguiram para Porto Alegre, São Paulo e Peru. Paralelamente às costuras, está cursando o último semestre da formação em Design de Moda na UCPel.
Joana de Leon dos Santos “Doida da Espanha” – apelido carinhoso de autoria do amigo Jonas Rodeghiero -, está divulgando mais uma boa ideia. Em conjunto com Larih Schiavon, será organizado atelier comunitário na Ocupação Coletiva de Arteirxs (OCA) – Praça da Alfândega. Conforme acrescenta, trata-se de projeto social que oferecerá aulas e núcleo de produção aos interessados em aprender técnicas para reuso de tecidos. Ela menciona: “O principal foco é a presença das mulheres que estão à margem na sociedade. Pretendemos oferecer a elas um suporte profissional. Assim, não permanecerão à mercê dos homens, tampouco dos governantes. O saber popular é o que há de mais rico, e a troca e interatividade geram ideias muitos melhores.
Por isso, eu e a Larih acreditamos que a ideia vai dar certo. O maquinário já está na OCA. O que está dificultando o início, é a quantia para regulagem das máquinas. No entanto, esperamos conseguir em breve. Daí passaremos a profissionalizar os participantes. O objetivo é também trabalhar com o lixo e, dependendo do andamento, poderemos nos cooperativar. E juntos somos mais fortes”. Para conhecer o trabalho de Joana, peças podem ser visualizadas no Facebook. Encomendas e informações no fone: (53) 9101.4596.
INÍCIO – Moradora do Arco Íris, Joana comenta sobre o início do interesse pela costura: “Eu não tinha me ligado, mas depois que comecei a lidar com as máquinas, redescobri a paixão que tinha quando criança. É o cheiro de óleo e a poeira dos tecidos que haviam na casa da tia Magali. Ela tecia e costurava, e aquilo voltou em mim com uma motivação gigante. Na adolescência costurava algumas coisas, e acho que sempre fui criativa. Porém, não tinha consciência disso até ingressar no curso de artes em 2006. Foi a oportunidade de encontrar pessoas incríveis, com pensamentos e ações parecidos com os meus. Essas relações mudaram o rumo da minha caminhada. E durante um tempo cursei artes. Até que ganhei bolsa do Prouni e fui para o curso de moda. Eu já estava trabalhando com costura. Mas o momento crucial ocorreu mesmo em 2007. Eu meu companheiro encontramos muito tecido no lixo. Levei para casa, lavei e decidi que iria me dedicar à costura. Ganhei uma máquina da minha tia costureira. Daí, foram dias e noites na busca do conhecimento técnico. E, descobrir sozinha, foi determinante para a maneira que desenvolveria meu trabalho. Então, meu trabalho resultou, tanto do material encontrado no lixo, quanto da relação solitária de aprendizado com a máquina”.
CONSUMISMO – O vestuário move indústria poderosa, com grifes que ditam comportamentos e valores. Joana avalia: “A moda é a grande indústria da exploração da vaidade e da força de trabalho. Ela te força a consumir um produto para parecer com fulano ou beltrano. Somos todos ‘Barbies’. Em contrapartida, essa dimensão das criações próprias e da ressignificação do usado, torna a coisa menos sistematizada. Mesmo assim, algumas marcas que começam pequenas e bem intencionadas, acabam caindo no mais do mesmo. E, para revender, passam a produzir produtos em maior escala. Na minha ideia de trabalho isso não rola, pois a massificação não me contempla. Eu tenho muito carinho com os brechós, pois se pode imaginar mil aproveitamentos para uma peça. É muito legal ressignificar, modificar ou manter a história de uma peça. Pode-se até desconhecer a trajetória, mas sabemos que há uma história ali”.
LIXO – E Joana comenta acerca do reaproveitamento: “Considero o lixo como fonte de inspiração. E não apenas os tecidos. Eu gosto de catar coisa na rua. E encontrar outros usos para o material que acho nas lixeiras. A ‘Maria Molambo’ que está em mim, grita quando vê um lixo. Encontro coisas incríveis, e já encontrei até vestido dos anos sessenta com cabide. Sinto-me feliz. Enquanto alguém vai para o shopping, eu vou para os contêineres de lixo. E os tecidos aparecem com freqüência. E me encanto com o povo que trabalha com os restos dos outros”. Ela conclui: “Existe uma nova postura de consumo, que vem com toda essa onda de dar uma sobrevida a nós, humanos, na Terra. E isso reflete diretamente no vestuário. O pessoal está frequentando as feiras, brechós e o armário da avó. É uma forma de resgate da própria história. Também me interessa como os grupos se ‘fantasiam’, o que permite identificar a ideia e postura de alguém. Basta olhar os ornamentos, é algo bem tribal que nos identifica como iguais sem trocar uma palavra”.