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Em vez de repressão, solidariedade no combate ao crack

Em vez de repressão, solidariedade no combate ao crack
24 julho
18:01 2017

Equipe de Redução de Danos da Prefeitura atua para melhorar a saúde de dependentes de drogas

São 15h de quarta-feira, 19 de julho. Na parte de trás do Cemitério Ecumênico São Francisco de Paula, centenas de sepulturas antigas. Em um canto, quatro homens de idades variadas, sentados ao sol, e algo em comum: o crack.

Uma dupla de agentes da equipe de Redução de Danos se aproxima do quarteto. Entrega a eles preservativos, panfletos informativos e conversa. Sua missão não é convencê-los a parar de usar drogas – quando isso ocorre, é motivo de alegria, porém não é o principal. O trabalho é reduzir os danos causados por elas e melhorar a qualidade de vida de dezenas de pessoas que não conseguem deixar de ter o álcool ou outras drogas em sua rotina diária.

Todos os dias, nove servidores da Secretaria de Saúde (SMS) saem para visitar quatro grandes regiões

Todos os dias, nove servidores da Secretaria de Saúde (SMS) saem para visitar quatro grandes regiões

Todos os dias, nove servidores da Secretaria de Saúde (SMS) saem para visitar quatro grandes regiões: Fragata (inclui Guabiroba, Simões Lopes), Areal, Três Vendas, Porto/Balsa/Centro. À noite, o trabalho é coletivo. A equipe lota uma Kombi, às vezes acompanhada por médico e enfermeiro, e percorre um dos territórios mapeados em que se concentram os usuários.

Cristina Viana coordena a equipe. Conta que costumam ser bem recepcionados nos lugares visitados. Em 11 anos de trabalho na Redução de Danos, nenhum integrante da equipe sofreu agressão física. “Os donos dos bares já nos conhecem e o pessoal da equipe sabe como chegar nas pessoas, sem se expor demais.”

O trabalho da Redução de Danos é focado na prevenção e na promoção de saúde, tendo por base a informação – muitos dependentes químicos querem buscar ajuda e desconhecem os serviços oferecidos pelo sistema público. “Cada pessoa tem sua história de vida, muitas envolvem episódios de abuso e violência”, pondera Cristina. Nas conversas, os agentes falam sobre os danos que as drogas causam. “Somos saúde, não repressão, ajudamos o usuário a refletir e agimos conforme a demanda dele, não impomos abstinência, mas ajudamos a quem quiser parar a lidar melhor com os efeitos dela”, esclarece a coordenadora.

As fontes da solidariedade

O serviço de Redução de Danos é informado dos casos de dependência química por meio de indicações de vizinhos, de outros usuários, de familiares, por denúncias e também pelos Centros de Referência em Assistência Social (CRAS) e Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Eles acompanham de perto não só a vida dos usuários, mas de toda a sua família e encaminham os que necessitam de algum tipo de serviço (idosos, crianças, gestantes, grupos de apoio a diabéticos, hipertensos, alcoólatras) às Unidades Básicas de Saúde em que a equipe está lotada. A do Fragata, por exemplo, faz o acompanhamento de doze famílias e está para conhecer outras quatro.

Nas visitas, são repassadas orientações básicas, como a importância de se alimentar bem e beber bastante água para reduzir os danos das substâncias tóxicas e não compartilhar material, sobretudo seringas, para evitar contrair outras doenças. Também são informados como funcionam os locais que acolhem usuários para que, quando decidam ir para um destes estabelecimentos saibam de antemão as regras, o que facilita a adaptação e reduz o índice de desistências.

A agente Mariléia Braga diz que às vezes a impressão é de que o usuário nem está ouvindo. No entanto, há surpresas: “Uma vez eu falava com esse menino, ele nem me olhava, era como se eu estivesse falando sozinha, quando voltei lá, semanas depois, ele tinha uma garrafa de água do lado”. Para a equipe, o fato já é um pequeno ganho na luta dura contra o vício.

No Cemitério

Após alguns minutos de conversa com os quatro usuários, no Cemitério do Fragata, A.P.N. e J.J.N.P. manifestam a vontade de largar a pedra. A.P.N., 34 anos, começou com outras substâncias e é usuário de crack há dez anos. Mora com os pais e o que ganha como cuidador de carros mal dá para pagar a pensão dos filhos e o vício. Diz que tentou parar várias vezes e teve recaídas.

J.J.N.P. tem 40 anos. A falta dos dentes é um dos indícios do uso constante de crack, que faz há 20 anos. Também trabalha como cuidador de carros, mas diz ser ajudante de pedreiro e ter outras habilidades. Os agentes informam aos dois sobre os serviços de desintoxicação feito no CAPS AD e a possibilidade de permanecerem até seis meses na Unidade de Acolhimento Adulto (UAA), enquanto procuram um emprego.

Há casos tristes e há recompensas. Como o de um jovem que a equipe encontrou anos atrás. Vinha a pé de Guaíba. “Estava na ‘última’”, recorda a agente Lourdes Rodrigues dos Santos. O rapaz foi atendido, encaminhado para tratamento, cursos profissionalizantes gratuitos e conseguiu se recuperar. “Tempos depois, o encontramos na cracolândia, ficou muito envergonhado quando nos viu”, lembra.

Lourdes disse que não precisava se envergonhar e recomeçaram do zero. “Hoje ele trabalha em Canoas e está há dois anos e meio em abstinência”, comemora. “Fico muito feliz de entrar no Facebook e acompanhar as postagens dele, saber que está bem, é bonito de ver!”

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