ESPIRITISMO : Deus não maltrata e a felicidade é deste mundo
Recuperando-se de acidente vascular cerebral (AVC), espírita Raul Teixeira completa cinquenta anos de mediunidade
Por Carlos Cogoy
Em 1984 ele esteve pela primeira vez em Pelotas. Dez anos depois, após inúmeras conferências, foi homenageado com o título de Cidadão Pelotense. No sábado, o educador e escritor Raul Teixeira, fluminense de Niterói, participou de programação especial. Orador espírita com quarenta anos de palestras e explanações, em fase recente Raul está fragilizado. Há cinco anos, durante voo, ele sofreu AVC. Desde então, sua fala está limitada. Dedicado à rotina com fisioterapia e tratamento fonoaudiológico, gradativamente tem se comunicado melhor. No Theatro Guarany repleto, Raul foi homenageado com placa.
Ele está comemorando cinquenta anos de mediunidade. No evento “Raul e Nós, Um Diálogo Entre Corações”, realização do Centro Espírita Paz, Amor e Caridade, Lar Espírita Assistencial Irmão Fabiano de Cristo, e Sociedade Espírita Assistencial Dona Conceição, com apoio da Liga Espírita Pelotense (LEP), o palestrante foi o médico psiquiatra Sérgio Lopes. O cerimonial foi conduzido por Edenir Madeira – departamento de comunicação da LEP -, e à mesa participaram: Alexandre Colvara (Conselho Regional Espírita 5ª Região, representando a Federação Espírita/FERGS); Eliane Bittencourt (vice-presidente da LEP); Teltz Cardoso Farias (Santa Maria); Lucas Stahlecker (Centro Paz, Amor e Caridade); Nara Nogueira (Lar Assistencial Fabiano de Cristo); Ieda Scaletscky (Sociedade Dona Conceição).
FELICIDADE – Dupla sertaneja “Raul e Sérgio”. Descontração do psiquiatra Sérgio Lopes, ao mencionar a sequência da parceria com o médium Raul Teixeira. Afinal, a exemplo do ano passado, diante da limitação de Raul, a palestra ficou a cargo de Lopes. No encerramento, durante instantes, Raul comunicou-se com o público. Na fala de Lopes, ênfase na felicidade: “Raul conosco é festa e comemoração, pois podemos desfrutar da convivência com ele. Na sua trajetória, sempre abordou acerca das questões espirituais que a doutrina oferece. Mas, se os conceitos são claros, difícil é vivenciá-los, passarmos da teoria para a prática.
E agora estamos diante de demonstrações vivas, da atitude de um ser humano. No capítulo quinto do Evangelho Segundo o Espiritismo de Allan Kardec, consta o tópico ‘A felicidade não é deste mundo’. A máxima está associada com o que geralmente se considera como fonte de felicidade: fama; prestígio; poder; riqueza. Essa mensagem tem mais de dois mil anos, e distingue o senso material e a vida espiritual. Vivenciamos o paradigma advertido por Jesus, ou seja, queremos ser felizes através de coisas impossíveis. Outra questão é que, neste plano, sofremos, passamos por provações e expiação. Ora, essa é a continuidade do discurso judaico-cristão. Então, a doutrina espiritual em consonância com o dia-a-dia. Mas, de fato, o que é a felicidade? Quem deseja ser feliz? Para o enfermo, felicidade é recuperar a saúde. Para o inquilino que paga aluguel, a perspectiva é a casa própria. Para o desempregado, a oportunidade de trabalho. Para o carente afetivo, a chance de amar. No entanto, se observarmos tais exemplos, após um ano, a postura será diferente.
Para aquele que estava doente, talvez nem lembre do que sofreu. Para o ex-inquilino, após os meses iniciais na casa nova, aquela janela que admirava, vai se tornando invisível. O desempregado, já de volta ao mercado, vai percebendo que o salário não é o ideal, que pode estar sendo explorado pelo empregador. O casal, que considerava o encontro como ‘almas gêmeas’, pode expressar saudade da época como solteiros. Então, parece que Deus primeiro maltrata, para depois premiar. Num dos livros de Raul Teixeira, porém, está o capítulo ‘A felicidade é deste mundo’. Conforme explica, é uma ideia equivocada a vocação para o sofrimento. No ‘Livro dos Espíritos’, que está completando 160 anos, não encontramos nenhuma ‘lei da dor’. Se Jesus expressou ‘bem-aventurados os aflitos’, não tratava a dor como alvo. Se assim fosse, teríamos evoluído e não haveria guerras”.
VIRTUDE – De acordo com Sérgio Lopes, a dor não é fundamento, mas instrumento. “Existem problemas e situações. Para a questão de saúde, uma medicação. Para os males financeiros, apesar das contingências políticas, o trabalho. Para tais problemas, as soluções dependem de nós. Muitos terceirizam, acreditam que o Centro Espírita possa resolver. Sofremos quando terceirizamos soluções. Queremos culpados, e nos consideramos vítimas. Outro tipo de sofrimento, no entanto, como disse Jesus Cristo, isto é, ‘bem-aventurados os aflitos’, não se refere àquele que está submisso e acomodado. Mas algo alheio a nossa vontade. Como exemplo, Raul Teixeira.
O AVC, situação imposta pela vida. Muitos especulam, considerando que deve ser algo pendente de outra vida. Então dor e expiação. Ora, se nem sei da minha vida, vou saber sobre o Raul. Talvez fosse comigo e estivesse num quarto. Mas ele veio aqui, reencontrar os amigos. Se já não há a palestra retumbante, demonstra através do fato vivenciado em si mesmo. A doutrina espírita é do presente, futuro, construindo gigantes na experiência de crescimento. Raul fala da paciência, e escolheu não sofrer. Não mergulhou na autocomiseração, mas busca o melhor dentro dessa nova perspectiva. Nosso dever é buscar a felicidade. Deus ajuda de dentro, como elemento de propulsão interior”.
DIÁLOGO ENTRE CORAÇÕES é projeto que tem reunido o psiquiatra Sérgio Lopes e o médium Raul Teixeira (Foto). A primeira edição ocorreu ano passado. Na ocasião, auditório da UCPel, Raul superou a limitação física e comunicou-se com o público. No sábado, com o Guarany lotado, expectativa por alguma manifestação do médium. Afinal, são quarenta anos como orador. E, ao fim do evento, pausadamente, ele foi ao microfone e ressaltou os 160 anos de “O Livro dos Espíritos”. Também mencionou sobre o AVC, há cinco anos, durante voo. Ele relatou que teve visões e achou que iria morrer. Até que o espírito do médico Bezerra de Menezes comunicou: “Você não vai morrer”. Raul expressou: “Vejo agora tudo que aprendi na doutrina. Não sofro, tenho muitos amigos que oram por mim. Deus é bom demais pra mim. E falta muito a apreender sobre o evangelho de Jesus”