LARANJAL : Cresce o movimento pela emancipação
Problemas do Laranjal são históricos, mas descaso do atual governo foi gota d’água para revolta da população
Foi surpresa tanto para os organizadores da audiência pública quanto para os vereadores, encontrar lotado o auditório da Escola Municipal de Ensino Fundamental Dom Francisco de Campos Barreto, no Valverde. Mais de duzentas pessoas, muitas em pé, participaram da reunião, proposta pela Câmara de Vereadores a pedido da Associação Comunitária do Laranjal, para discutir os problemas do bairro e a possibilidade de emancipação.
O tema principal foi a possibilidade de separação do município, que tem ganhado corpo nas discussões dos grupos que agregam a comunidade local. Além da Asclar, o Movimento de Emancipação do Laranjal, Mel, e o grupo Amigos do Laranjal defendem a separação do bairro do restante do município. A partir da audiência, na noite de quarta-feira, a Colônia de Pescadores Z3 aliou-se ao movimento.
Segundo seus representantes, os problemas da praia se arrastam há décadas, mas o descaso do atual governo com questões fundamentais como a falta de água, pavimentação, esgotos, iluminação e saúde fizeram crescer o desejo de autonomia.
“As solicitações encaminhadas à Prefeitura não têm sido atendidas. O Laranjal é a única praia de Pelotas, e mesmo sendo um bairro como os outros, merecemos um tratamento diferenciado porque somos o cartão-postal da cidade,” afirmou Martha Bianchi da Rocha, da Asclar. Christian de Souza, do Amigos do Laranjal, endossou as palavras de Martha e completou: “aqui os buracos viraram ruas, o transporte público está prejudicado. Cansamos de pedir. Queremos virar um município para atrair recursos e crescer”.
ABAIXO-ASSINADO – Já circula em pontos comerciais da praia um abaixo-assinado para obter quatro mil assinaturas favoráveis a um Estudo de Viabilidade de Emancipação a ser encaminhado à Assembleia Legislativa. Esse estudo é que poderá determinar se o Laranjal reúne as condições legais para se separar de Pelotas.
Cláudio Amaral, do Mel, responsável pela área jurídica do processo que pode levar à emancipação, fez um relato dos estudos que estão sendo encaminhados. Explicou que no momento não existe uma legislação específica sobre o tema, mas que a lei que foi aprovada no Congresso e vetada pela presidente Dilma será novamente votada e o veto poderá cair. “Com isso, novos municípios poderão ser criados, inclusive o do Laranjal”.
Segundo o advogado, ao contrário do que tem sido divulgado, a praia incluiria toda a área após a ponte na avenida Adolfo Fetter que leva aos balneários e à Colônia de Pescadores de Z/3, que somam bem mais de 20 mil moradores, número mínimo para um processo de emancipação.
LEGISLATIVO – O presidente Ademar Ornel (DEM) afirmou, ao final da audiência, que reunirá todas as manifestações apresentadas para encaminhar ao Executivo. “Vamos marcar uma agenda com o prefeito, chamar os moradores e apresentar as suas reivindicações”.
Segundo o parlamentar, a indignação demonstrada na reunião reflete o sentimento da comunidade praiana: “vocês não tem o básico que são ruas em condições para passar o carro, valetas limpas, água o ano todo, posto de saúde. Quando se fala em Pelotas, se fala em Laranjal, mas não damos valor ao que temos de mais importante. O governo abandonou a cidade e, em especial, ao Laranjal”.
Além do presidente, estavam presentes os vereadores Rafael Amaral (PP), Beto Z3 (PT), Toninho Peres (PSB), Marcos Ferreira (PT), Marcus Cunha (PDT), tenente Bruno (PT), Waldomiro Lima (PRB) e Edmar Campos (DEM). Além de cumprimentar a comunidade que lotou o auditório da Escola Campos Barreto, eles colocaram seus gabinetes à disposição para levar adiante a luta emancipatória e as reivindicações da praia.
Rafael Amaral reside no balneário com a família e compartilha dos problemas. Mostrou uma pasta com pedidos de providências encaminhados ao Executivo e disse que “nem 15% do que se pede se consegue”. E completou: “o que falta é planejamento. A emancipação é um sonho, mas se caminha para isso”.
O vereador Marcola enfatizou a ausência do secretário de Serviços Urbanos, Caco Villar, também morador do Laranjal. “Ele tinha que estar aqui para dizer por quê não faz. Para dizer qual é a contrapartida que os condomínios que estão sendo construídos vão dar para o Laranjal. Apoio o movimento de emancipação”.
A favor da emancipação, Marcus Cunha pediu aos presentes para não subestimarem seu movimento. “Participei das emancipações em Turuçu e Morro Redondo e no início tinha muito menos gente do que aqui”. Cunha fez um comparativo entre as duas metades do Rio Grande do Sul: “A Metade Norte está muito mais desenvolvida porque lá os municípios são pequenos e ricos, e aqui nós somos grandes e pobres. Quanto mais a administração está próxima da população mais fácil fica de fiscalizar”.
O vereador Waldomiro Lima não se mostrou favorável ao movimento emancipatório e sugeriu uma subprefeitura. “O maquinário ficaria todo no Laranjal, não passaria da ponte para lá (a cidade)”.
Edmar Campos disse que ao entrar na praia para participar da audiência, indignou-se com o que viu, ruas esburacadas, pouca iluminação. E alertou: “preparem-se para o verão, com as obras no entorno, a situação vai ficar pior ainda, principalmente a falta de água”.
Já o Tenente Bruno afirmou que “não é o Laranjal que quer abandonar Pelotas, mas Pelotas que abandonou o Laranjal”. “Quando chega novembro, bota umas lâmpadas na beira da praia, uma internet livre e acha que está tudo bem. Da ponte para cá é outra cidade. Vocês estão abandonados, na segurança pública, na saúde, na mobilidade urbana”.
Ao apoiar o movimento de emancipação, o vereador Toninho Peres disse que a comunidade certamente enfrentará barreiras, “mas tem que ficar mobilizada”.
Morador da Colônia Z3, o vereador Beto Z3 disse que falava também em nome do Balneário dos Prazeres. “O Laranjal é a região que mais contribui com a receita do município, com suas pousadas, restaurantes, mercados, e na Colônia de Pescadores com o pescado e as granjas de arroz e de soja. É um movimento justo, de quem perdeu a paciência”.
Na mesma linha do parlamentar, o presidente da Associação da Colônia Z3, Nilmar Conceição, disse que a situação local é muito pior do que no restante do Laranjal. “Nós não conhecemos patrola, só conhecemos trator com rastilho e óleo diesel de uma empresa que passa por lá quando pode”. Ele lembrou a situação do posto de saúde, “inaugurado e reinaugurado e que só tem uma médica”.
Eugênia Adamy Basso, moradora do Recanto de Portugal, recolheu, sozinha, mais de cem assinaturas de moradores. “Não temos luz, nem lixeiras e nem coleta de lixo. Já pedimos para a Prefeitura que nos dê o material para pavimentar as ruas que nós pagamos a mão-de-obra”.
O historiador Felipe Gertum disse ser “totalmente favorável á emancipação e agradeceu o apoio do Legislativo. É essencial ao movimento”.