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MÊS DAS MULHERES : Nos pódios pelo mundo, pelotense Rochele Nunes conta sua história

MÊS DAS MULHERES :  Nos pódios pelo mundo, pelotense Rochele Nunes conta sua história
18 março
09:10 2021

Atleta do Judô compete por Portugal desde 2018, tem conquistado medalhas, mas ainda guarda cidade-natal no coração

“Sempre um prazer falar para minha cidade-natal. Não vou mentir, é uma das minhas cidades favoritas no mundo todo. Está no meu top 3”, inicia a judoca Rochele Nunes, 31 anos, competidora da categoria +78kg. Ela tem subido no pódio nas competições pela seleção de Portugal. Após várias medalhas mundiais de bronze, no começo de 2021 já conseguiu chegar à sua primeira final de Grand Slam, em Tel Aviv, e ficou com a prata.

“Comecei no Judô em 1998, na cidade de Canoas, onde eu cresci. Eu fazia ballet, mas, por influência do meu irmão, que já fazia o Judô, pedi para meus pais. Eles ficaram receosos, mas deixaram. Começamos muito por influência dos desenhos: Dragon Ball Z e Tartarugas Ninja. Então meu irmão queria fazer algo parecido. Meus pais tentaram ver o Taekwondo e o Karatê, mas o mais próximo da nossa casa era o Judô. Nunca imaginava me tornar atleta profissional”, relata o começo inusitado.

“Cresci com meu irmão, então não tinha tanto a referência de meninas. Tinha minhas amigas, mas em casa assistia ao Dragon Ball. Comecei a competir na categoria Júnior quando tinha 15 anos e acho que foi aí que decidi ser atleta profissional. Fui em um Sul-Americano, para fora do país, ouvi o hino, fiquei super emocionada e pensei ‘é isso que quero para minha vida’.”

De acordo com Rochele, foram 10 anos na seleção brasileira, mas somente em 2018 houve a guinada decisiva para sua carreira: ir para Portugal. “Eu era a terceira atleta brasileira em 2018, então era difícil eu ir aos Jogos. Em uma conversa informal, juntamos a fome e a vontade de comer. Havia o meu interesse e também houve o interesse da Federação Portuguesa, do Comitê Olímpico e do Benfica, clube que me acolheu. Pensei muito, mas vi que valia a pena. Reacendeu a chama, entrei de cabeça nisso. E deu muito

certo. Na primeira competição por Portugal, consegui medalha e percebi que não estava competindo só para tentar ir aos Jogos Olímpicos, mas também por lugar no pódio mundial”, relembrou.

Rochele se adaptou ao novo país. A primeira função foi aprender o hino. Ela não queria passar vergonha nas competições e, aos poucos, criou o vínculo que considerava necessário ter com Portugal. “Já que eu não tinha raízes aqui, mas hoje consigo dizer que sou cidadã portuguesa.”

“A pandemia me ensinou muita coisa. Mostrou como nossos sonhos podem ser frágeis.” A atleta mudou a marcha. O sonho para os Jogos Olímpicos é hoje um objetivo palpável. Atualmente está em 9º no ranking para ir a Tóquio. Quer ficar entre as oito melhores para saber com quem luta, podendo prever melhor a competição no Japão.

E quando ela se referiu a Pelotas no Top 3 mundial, ficamos curiosos para saber quem está junto: “Meus lugares favoritos no mundo são Austrália, onde conheci uma cidade chamada Perth, até há muitos brasileiros lá. Linda e com qualidade de vida. E o Japão, onde começou o Judô e onde são os Jogos Olímpicos , mas Tóquio já era um dos meus lugares favoritos”. Afirma na experiência de ter conhecido mais de 44 países.

“Inclusive uma página no Instagram, a Pelotas da Depressão um dia perguntou se alguém conhecia as Ilhas Maurício e eu respondi que sim. Acharam engraçado haver pelotenses por tudo”, risos.

O carinho de Rochele pela cidade de Pelotas é pelas boas memórias, onde passava as férias. A família é toda pelotense. Também é torcedora do G.E. Brasil e sua banda favorita é a Sente o Clima, grupo de samba.

“Aqui em Portugal tivemos períodos de confinamento, um por mais de 50 dias. Tive o privilégio de estar com cinco atletas do meu clube, os cinco olímpicos na casa. Improvisamos tatame, academia e conseguimos manter a forma, mesmo sem sair. Era só para mercado e muito raramente. No momento, estamos em outra cidade isolada e treinamos com outros atletas. Às vezes vêm espanhóis, belgas, finlandeses para treinar conosco. O Judô, apesar de ser individual, a gente treina de forma coletiva. O país tem nos ajudado, nos destacamos nisso de manter a qualidade. Todo mundo é testado antes dos treinos e ficamos no hotel, sem contato externo”, afirmou sobre a pandemia.

Rochele com medalha mundial conquistada em Tel Aviv, em 2019

Na expectativa pelos Jogos Olímpicos de Tóquio, transferidos para este 2021, Rochele Nunes tem alcançado grandes resultados. “Vim recentemente de um Grand Slam com medalha de prata. Foi minha primeira final em GS. Tenho somado medalhas no circuito, mas ainda não me vejo como favorita ao pódio. Até é bom não ser favorita, porque no Judô pode esquecer o favoritismo. Vale de nada, porque não existe luta ganha ou vencida, tem que sempre fazer tudo novamente. Vim de bronze no Campeonato da Europa, que é muito forte e que tem etapa em abril em Portugal. Então, mesmo sem torcida, é uma motivação a mais”, avalia o momento.

Sem torcida. Interessante. Como funciona a torcida no Judô? “Quando é no seu país, a torcida impulsiona, impõe pressão sobre os árbitros, mas também sobre os atletas. Tem uma etapa do Circuito Mundial em Paris em que as pessoas pagam ingresso e lotam o ginásio. Tive a felicidade de medalhar na última. E é onde artistas como Rihanna e Beyoncé fazem show e as pessoas pagam para assistir ao Judô. Então nessa competição faz diferença o público. Mas, na maioria das etapas, fora do país, nossa torcida são os colegas de seleção, que vão continuar torcendo. Então, essa diferença não percebo tanto. Até favorece ouvir a voz dos companheiros.”

Rochele é uma representante de várias vertentes. Atleta de esporte com pouco reconhecimento. Imigrante, por morar em outro país. Representante das mulheres negras: “Sinto gratidão pelo que tem acontecido na minha vida. Minha realidade é a de muitas pessoas. Sou mulher, sou preta, sou pesada, mais gordinha, então sei que essa não é a realidade do que destacam. Quando posso, sempre dou a voz por essas pessoas. Sim, vocês podem conseguir, com disciplina, querendo de verdade. Ainda mais no Esporte, principalmente no Judô, encontramos e fizemos um caminho para conquistar mais espaço, para sermos vistas. A próxima geração sempre se espelha na anterior. É uma responsabilidade, mas uma gratidão também. E também pelos meus pais, que trabalharam na minha educação e quero passar isso adiante”, encerra com chave de ouro.

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