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quinta, 02 de maio de 2024

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O Farroupilha e a importância do lado social no futebol

09 setembro
08:50 2020

Em época de pandemia, longe das grandes vitrines, os menores clubes, que deveriam ser os maiores no coração de suas comunidades, relatam as dificuldades

Por: Henrique König

O ano de 2020 invoca diversas reflexões no seio da sociedade. As dificuldades para trabalhadores e microempresários, os problemas de saúde pública, o afastamento obrigatório e prorrogado entre pessoas que tanto gostamos. O futebol de verdade está inserido neste contexto, assim como as demais modalidades esportivas. Longe do centro da atenção dos televisores nacional e internacionalmente, os pequenos clubes lutam contra a falência e seus funcionários buscam alternativas para o sustento das famílias.

Um dos coordenadores de base no Farroupilha e profissional da preparação física, Luciano Proença integraria a comissão técnica de Eugênio Lopes na Segunda Divisão Gaúcha, a Terceirona. O campeonato foi adiado, assim como a continuidade do Gauchão e da Divisão de Acesso – esta encerrada na decisão dos clubes com a FGF. A Terceirona ainda não está completamente descartada, mas tudo a leva a crer que o torneio não ocorra em 2020. De acordo com Luciano, uma alternativa para o fim do ano pode ser uma copinha, com formato reduzido e o mais regionalizado possível, para colocar em atividade os clubes interessados e com elencos. Mas os recursos para disputa e a premiação são pouco atrativos.

“Sem pleitear vaga nacional ou em maiores competições fica difícil. Estamos em questionamentos internos no Farroupilha”, declara Proença. O profissional relata que as dúvidas estão nos clubes da Terceirona, que lidam com as dificuldades para obter visibilidade, patrocínio e recursos para viagens, concentrações e treinos. Em 2020, mais do que nunca. “Se as pessoas, se as comunidades não mudarem o tratamento, pode ser o começo do fim para muitos clubes.”

Luciano Proença em visita à FGF em 2019

Luciano Proença em visita à FGF em 2019

E os clubes são compostos de pessoas que integram quadros profissionais, sejam comissões técnicas, secretarias, porteiros, massagistas, nutricionistas, até finalmente os protagonistas do campo, os atletas.

Luciano Proença conta que o Farroupilha formava para 2020 um grupo de jogadores do extremo sul, de Pelotas a outras cidades próximas, como Capão do Leão e Pedro Osório, com prioridade para os que pudessem e ir e vir diariamente. Com a pandemia e a interrupção do futebol no Tricolor, muitos jogadores buscam alternativas. Uns foram para o Maranhão, outro tenta carreira no exterior, mas a maioria tenta alavancar uma renda para sustento na própria cidade, entre serviços de entrega, construção civil e pequenas vendas.

“É a realidade para mais de 80% dos profissionais do futebol. O futebol está sendo tratado como bico nos clubes do interior. Se não houver mudança futura no calendário, será insustentável. São profissionais que atuam durante três ou quatro meses e no restante do ano precisam trabalhar com outras coisas.”

Traço o paralelo com as demais modalidades, como voleibol, basquete, handebol ou atletismo, em que os atletas e comissões técnicas se espelham no futebol, modalidade com maior visibilidade na imprensa e recursos de patrocínio. Mas ao invés dos demais esportes subirem degraus rumo à desejada profissionalização, o futebol do interior é que tem decaído, com a falta de interesse das empresas e a má distribuição de recursos causando o desemprego ou vagas somente temporárias, pelos três ou quatro meses mencionados por Proença.

“O torcedor precisa se reaproximar da realidade. O futebol com glamour da televisão está distante de nós. Agora com a pandemia, o futebol sem público perde o seu preceito popular, a sua história de participação do povo, está cada vez mais elitizado. Sem gente nos estádios, só acompanha hoje quem tenha canais por assinatura ou internet de qualidade em casa.”

O caminho para resgatar os clubes é fazer as comunidades entenderem a realidade das equipes menores, entenderem que nos clubes há pessoas que precisam de apoio, dos empregos para sustentarem famílias. O futebol do interior já definhava e, com a pandemia, a separação com os maiores clubes escancarou o abismo.

“Hoje muita gente não liga, mas futuramente os próprios clubes grandes vão sentir o efeito, porque os atletas dos grandes centros muitas vezes vêm dos clubes menores, do interior e, se eles não jogarem pelo interior, como serão descobertos?”, questiona Proença.

O Farroupilha está há um ano e meio sem jogos oficiais dos profissionais e não sabe quando volta a campo. O Diário da Manhã demarca o compromisso em ouvir e contar as histórias dos atletas e funcionários que desejam fazer parte das campanhas pelo Tricolor e seguir a vida nesse momento tão difícil para o povo brasileiro.

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