SOPAPO : Linha do tempo da conquista do tambor como patrimônio
Protagonismo negro foi decisivo para a lei que está sendo sancionada pela Prefeita
Por Carlos Cogoy
Pelotas reconhece formalmente, o pulsar das batidas de um ritmo que está nas entranhas da linha do tempo de sua própria existência. Afinal, se a Freguesia de São Francisco de Paula é de 1812 – cidade somente em 1835 -, o toque do tambor confeccionado pelos trabalhadores negros escravizados, confunde-se, na segunda metade dos século 18, com o surgimento das primeiras charqueadas na região. É o que reafirma Andrea Mazza Terra no depoimento ao escritor pelotense José Batista – autor de “O Sopapo Contemporâneo – um Elo com a Ancestralidade” -, lançado neste ano.
Na obra do filho de Neives de Meireles Baptista (1936/2012) – griô Mestre Baptista -, também menções aos primeiros registros na imprensa sobre os batuques, bem como a pintura “Dança dos Negros”, criada pelo pintor alemão Herrmann Rudolf Wendroth em 1852. Já em meados dos anos quarenta no século passado, o instrumento aparece na percussão do Carnaval pelotense. A partir dos oitenta, no entanto, em decorrência da influência da sonoridade do Carnaval no Rio de Janeiro, o tambor praticamente desaparece. Coube ao pelotense Giba Giba (1940/2014), “redescobrir” o Sopapo através do projeto Cabobu no governo estadual de Olívio Dutra (PT). Para o resgate, o trabalho técnico do griô Mestre Baptista, já acompanhado pelo filho “Zé Batista”. Algumas etapas da trajetória do tambor que, nesta sexta, através da Lei 9615/21, que será sancionada pela prefeita Paula Mascarenhas, passa a ser reconhecido como Patrimônio Imaterial de Pelotas. Porém, no início deste ano, o samba quase atravessou…
COLETIVIDADE – Na Assembleia Legislativa, como consequência de lobby ilegítimo e pouco representativo, em relação ao Sopapo, foi criado projeto que focava no tambor pelotense. A contradição foi flagrada por integrantes do movimento negro, como o pelotense José Batista e o griô Edu do Nascimento – filho de Giba Giba. Em março foi proposto um debate junto a lideranças negras, e houve a criação de grupos em Porto Alegre e Pelotas. O protagonismo negro pressionou instâncias como as secretarias municipal e estadual de Cultura, e o projeto foi retirado do trâmite no Legislativo gaúcho. A seguir, a coletividade apresentou a ideia na Câmara Municipal, e houve a guarida dos parlamentares, em especial de Paulo Coitinho (Cidadania), que resultou na Lei 9615/21.
MUSEU JÚLIO DE CASTILHOS em Porto Alegre, conforme a diretora, pelotense Doris Couto, estará recebendo um tambor Sopapo, confeccionado por José Batista nesta sexta. Ela divulga: “Receber o tambor de sopapo com toda a história que esse tipo de instrumento teve nas charqueadas, na Pelotas no século 18 e, posteriormente, no Carnaval da cidade, e a partir do Projeto CaBoBu, liderado pelo músico percussionista Giba Giba, configura-se como signo de resistência e elo das pessoas negras com sua pátria-mãe, a África. Então, significa permitir a ressonância da luta do povo negro gaúcho pelo direito à vida, e à dignidade, que a escravização lhes subtraiu”.
SEDAC – “Os museus, de modo geral, musealizam artefatos e objetos vinculados às elites. Nesse sentido, estaremos promovendo uma reparação histórica com a admissão do Sopapo produzido por José Batista, que foi um artífice fundamental no desenvolvimento dos sopapos, por meio do Projeto CaBoBu, criado pelo músico Giba Giba”, enfatiza a secretária estadual Beatriz Araújo (Secretaria de Estado da Cultura/SEDAC/RS).