Transplante de medula óssea estabiliza quadro clínico de paciente com esclerose múltipla
Procedimento realizado no Hospital Moinhos de Vento é inédito no estado para esse tipo de tratamento e conseguiu barrar avanço da doença
Uma solução pouco comum, e com indicações para casos e doenças bem específicas, conseguiu controlar a atividade da esclerose múltipla numa paciente que não respondeu a todas as medicações disponíveis. Ingret Silva Lanzoni, hoje com 39 anos, convivia com internações frequentes, e seu grau de incapacitação progredia rapidamente. Lesões provocadas pela doença autoimune causavam grave comprometimento de algumas funções. A alternativa foi a indicação de um transplante de células tronco hematopoiéticas, que foi realizado no Hospital Moinhos de Vento.
A coordenadora da Unidade de Internação Onco-Hematológica do Hospital, Claudia Caceres Astigarraga, ressalta que o transplante, nesses casos, é uma tentativa de “reinicializar” o sistema imunológico. “Coletamos as células tronco e congelamos. Por alguns dias, a quimioterapia e a imunoterapia são realizadas e depois inserimos novamente as células no paciente e aguardamos elas começarem a funcionar, o que é chamado de pega do transplante. O total da internação se estende, em média, por trinta dias”, explica a hematologista.
“As pessoas acham que transplante de células tronco, ou transplante de medula óssea como é mais conhecido, é realizado somente para casos de leucemia, de câncer. Mas uma série de doenças autoimunes, reumatológicas e neurológicas podem ser estabilizadas com esse procedimento, que temos disponível aqui no Hospital Moinhos de Vento”, completa.
Procedimento inédito no RS
O procedimento foi realizado de forma inédita no Rio Grande do Sul, em dezembro de 2019, com o objetivo de tratar a esclerose múltipla. Segundo Maria Cecilia Aragon de Vecino, coordenadora do Núcleo de Esclerose Múltipla e Doenças Desmielinizantes do Hospital Moinhos de Vento, depois de seis meses, a equipe considera que o transplante foi um sucesso. “Pela primeira vez em muitos anos a paciente está estável e sem sinais clínicos ou radiológicos de atividade da doença. Essa é uma vitória muito importante pois ela é jovem, estava numa situação grave com doença extremamente ativa e incapacitante, e as terapias, inclusive as de alta potência, não davam resposta”, pontua a neurologista.
Ingret foi diagnosticada com esclerose múltipla aos 27 anos. Foram 11 anos em busca de um tratamento que estabilizasse a doença. Ela conta que com o tempo ficou difícil caminhar, mas nunca sentiu dor. No Hospital Moinhos de Vento, teve acesso ao que a medicina oferece de mais moderno em terapias para a enfermidade. E foi aí que surgiu a possibilidade de se submeter ao procedimento experimental. “Tomei todos os medicamentos indicados até a última possibilidade, que era o transplante. Agora me sinto bem, não tive mais surtos ou lesões novas. Se alguém, na minha condição, tiver a oportunidade de fazer mais cedo, eu indico”, avalia a paciente.
Ela está retomando a autonomia para algumas atividades. Também não necessitou mais de internação hospitalar, algo que era recorrente neste caso. A médica pondera, no entanto, que é um tratamento indicado para casos específicos, para evitar a progressão da doença e melhorar a qualidade de vida. “Até o ano passado, esse era um procedimento experimental. Antes esgotamos todas as possibilidades terapêuticas convencionais e inovadoras”, destaca.
Agosto Laranja
Em 2006, foi instituído o Dia Nacional de Conscientização sobre a Esclerose Múltipla, em 30 de agosto. Por isso, o Agosto Laranja é uma campanha para conscientizar os brasileiros sobre a doença e suas formas de controle, além de dar mais visibilidade aos seus impactos na vida das pessoas.
A esclerose múltipla é uma doença neurodegenerativa autoimune e crônica que faz com que células de defesa do organismo ataquem o próprio sistema nervoso central, provocando lesões cerebrais e medulares. No Brasil, 40 mil pessoas foram diagnosticadas com o mal, que afeta jovens adultos com idades entre os 20 e os 40 anos, especialmente mulheres.
Segundo Maria Cecilia, a data é uma forma de fazer as pessoas refletirem. Apesar de incurável, a doença possui tratamentos eficazes no controle de sequelas e para a qualidade de vida do paciente – desde que o diagnóstico ocorra cedo. “No Hospital Moinhos de Vento dispomos de tudo o que há de mais moderno para o tratamento da esclerose múltipla. Também investimos em pesquisa, e agora, no Agosto Laranja, é uma oportunidade de mostrar resultados e de chamar a comunidade de pacientes para que procurem se envolver no assunto, buscando profissionais e trabalhos sérios e responsáveis”, afirma a neurologista. Ela cita a vitória no caso da paciente transplantada como um exemplo de esperança para os demais pacientes.
TMO no Hospital Moinhos
O primeiro transplante de medula óssea realizado na instituição foi em 2015. Até 2018, eram transplantes dos tipos aparentado (células-tronco de familiares) e autólogo (células próprias). No mesmo ano foi acrescido o pediátrico e em 2019 o não-aparentado, quando as células tronco utilizadas são de doador não familiar.
Até hoje, já foram realizados 137 transplantes do tipo no hospital. Pela primeira vez o procedimento é utilizado no tratamento da esclerose múltipla. Geralmente pacientes com essa indicação são encaminhados para São Paulo.
Desde 2017, por meio de um acordo de cooperação técnica, o Hospital Moinhos de Vento disponibiliza leitos no Centro de Hematologia para receber os candidatos ao procedimento listados no Hospital de Clínicas de Porto Alegre. Os pacientes são direcionados para o Moinhos, conforme a disponibilidade. No centésimo dia após a infusão das células, o acompanhamento tem seguimento no Clínicas.