Com votação indefinida no legislativo, programa de parcerias público-privadas (PPPs) da Prefeitura, é criticado pela oposição
Por Carlos Cogoy
A vereadora Fernanda Miranda (PSol), atendeu ao DIÁRIO DA MANHÃ e expressou sobre a oposição ao programa de parcerias público-privadas do Executivo. Com votação adiada, o projeto divide o plenário, e os parlamentares indecisos é que estarão definindo o resultado. Emendas foram apresentadas pela oposição, e a mobilização popular tem se intensificado junto aos vereadores.
DM – Em que etapa está o trâmite das PPPs na Câmara?
Fernanda Miranda – O projeto ainda não foi aprovado na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). O projeto recebeu emendas que deveriam ser avaliadas na quarta passada, porém, o presidente da comissão, vereador Viana, não reuniu a comissão nessa data, nem colocou o projeto em pauta na quinta passada, data regimental da reunião das comissões. Até o momento, nove emendas foram protocoladas, todas de vereadores contrários ao projeto de lei. A princípio, o projeto deve ser avaliado pela comissão na data regimental, na quinta-feira. Há possibilidade de chamada da reunião das comissões para data anterior, mas, ainda não há nenhuma convocação por parte do presidente da CCJ.
DM – As PPPs, como foi alegado, estariam legitimadas em decorrência da aprovação nas urnas, com a vitória eleitoral?
Fernanda Miranda – Não. O que foi debatido nas urnas foi o projeto de universalização do saneamento e a possibilidade de se fazer uma PPP para isso. Contudo, se há outras possibilidades, como o caso do projeto elaborado por servidores do SANEP, que prevê que todos os cidadãos pelotenses poderão ter esgoto tratado em nove anos, apenas com dinheiro público e com valor menor que o valor proposto pela iniciativa privada, o que está em jogo não são os interesses do povo, mas os interesses do mercado. Além disso, nosso entendimento é de que, se estamos em uma democracia, não basta que o voto nas urnas legitime qualquer tipo de atitude do governo eleito, nem que esse governo utilize de estratégias para retirar da lei a possibilidade da participação da população nas decisões sobre a interferência do setor privado no serviço público, como é o caso do projeto que está na casa, quando retira a obrigatoriedade de plebiscito para decisão sobre a entrega dos serviços públicos ao setor privado. Quando há a entrega dos serviços para o setor privado visando o lucro e a impossibilidade do controle social, ou seja, da fiscalização da aplicação do dinheiro público, não há dúvidas de que o que se está fazendo é uma privatização. E, nada disso foi tratado no projeto de governo defendido nas urnas. Importante também colocar que o projeto de governo do PSDB em Pelotas não indicava a entrega de patrimônio público como garantia, e não falava de projeto de parcerias com qualquer serviço público. Portanto, o projeto em questão não foi debatido nas urnas.
DM – A falta de recursos tem sido a justificativa para as PPPs. Como a bancada do PSol observa e avalia?
Fernanda Miranda – Para nós do PSOL, os interesses coletivos não podem estar atrelados aos interesses do capital. Somos favoráveis que o Estado seja o mantenedor das políticas sociais e, portanto, não pode haver nenhum tipo de lucro de empresas para que estes serviços estejam à disposição da população, que, através dos impostos que paga, já deveria ter a garantia dos serviços púbicos. No âmbito nacional, temos defendido maior investimento em políticas sociais, a realização da auditoria da dívida pública e a revogação da Emenda 95, que congelou investimento em saúde e educação por vinte anos. Infelizmente, o PSDB nunca estará defendendo essas ações. Ou seja, o mesmo partido que defende a entrega de dinheiro público para grandes empresas e que nega investimento em áreas sociais, justifica com falta de recursos para investimento em políticas públicas mas, em contrapartida, garante dinheiro público para os lucros do capital. Em âmbito municipal, falta uma boa gestão dos recursos, que, a nosso ver, estão sendo aplicados de maneira equivocada, em áreas que não são prioritárias. Não podemos esquecer que houve um aumento considerável de taxas e criação da taxa do lixo, o que garantiu ao SANEP um aporte de recursos que o levaram para o superávit. Por fim, uma solução plausível e que há muito tempo se tem falado, seria a diminuição do número de CCs, que no último período teve um crescimento altíssimo, e a valorização dos servidores municipais, que, valorizados, certamente, teriam melhores condições de prestar um serviço qualificado à população.
DM – As PPPs podem ser interpretadas como “parcerias”, ou não deixam de ser privatização?
Fernanda Miranda – Quando se entrega ao setor privado o poder total de um serviço público, com garantia de lucro, com pagamento por parte dos cidadãos, sejam através dos impostos, seja através de taxas e sem nenhum tipo de controle social, pode-se dar qualquer nome para camuflar essa entrega, como a prefeita Paula e alguns vereadores têm falado, tratando PPP diferente de privatização. Isso é estratégia linguística. Para nós do PSol, não há dúvida que isso é privatização.
DM – E a questão do plebiscito, que não seria mais necessário?
Fernanda Miranda– Temos visto na gestão Paula Mascarenhas uma falta de debate com a população. Não só nesse projeto, se vê esse tipo de caminho, porém, em vários outros como o Pacto pela Paz, o Código de Convivência, o Plano Diretor. Uma gestão que se pauta apenas nas urnas tem uma ideia equivocada do que é democracia. Não basta que a população decida de quatro em quatro anos. Para nós, a participação nas decisões deve ser constante. Com a retirada do plebiscito, o que se demonstra é o medo da participação popular.
DM – O projeto das PPPs seria uma atualização em relação à legislação federal?
Fernanda Miranda – É importante colocar para a população que já existe lei para parcerias público-privadas em Pelotas, inclusive que garante o plebiscito. O que o projeto que está na casa propõe, no entanto, é mais que a atualização dessa lei, ela propõe a criação do Fundo Garantidor, que coloca como garantia todo o patrimônio público municipal e também a criação do Comitê Gestor, que dá total autonomia para que apenas a gestão, juntamente com as empresas interessadas nas parcerias tomem as decisões. Retira, portanto, todo o controle social e participação da sociedade. Isso é privatizar com total garantia ao mercado de que não perderá nenhum centavo, com qualquer investimento que venha a fazer, pelo contrário, é garantia de lucro certo. Que vantagens a população tem nisso?
DM – A parceria poderia ter o teto de 35 anos. Como a oposição intepreta essa questão?
R – É pior que vender o público para o privado, pois a empresa terá garantias de que, após o término do contrato, não terá que investir mais nenhum real no projeto, que, em 35 anos já terá que receber novos aportes financeiros. Os riscos desse tipo de projeto é o aumento de taxas ou criação de novas taxas, que boa parte delas ou até mesmo as próprias taxas, servirão para pagamento do lucro dos empresários. Se haverá aumento de taxas e criação de novas e estas irão diretamente para o bolso dos empresários, por que não investir esse dinheiro diretamente no setor público?
DM – Há possibilidade de aumentos à população?
R – Representa a garantia do lucro certo ao empresário. Caso falte dinheiro nos cofres públicos, fica garantido o aumento de taxas ou criação de novas. Caso os cidadãos não paguem, ainda teremos como garantia a entrega dos bens públicos, conforme já mencionei. Portanto, esse projeto é bastante importante para o mercado, que está de olho em todo nosso patrimônio público. A água entra aí, não podemos nos esquecer disso.
DM – O Parque do Trabalhador, nos anos noventa, foi entregue por 99 anos para o setor privado. Seria um exemplo?
R – Um ótimo exemplo é o Parque do Sesi, principalmente em que tipo de retorno os pelotenses tiveram com essa entrega. Não há retorno nenhum. Há outros serviços públicos entregues à iniciativa privada e que estão aquém do que se necessita e sem fiscalização como o transporte público, o Pop Center, o estacionamento rotativo.
DM – E a mobilização popular em relação as PPPs?
R – A mobilização da população junto ao legislativo está bastante forte, e é ela que tem feito alguns vereadores e vereadoras não se posicionarem e a Prefeitura não ter os votos necessários para aprovação do projeto. É importante que, nesse tempo, possamos mobilizar ainda mais pessoas para cobrarem dos vereadores, principalmente os indecisos, uma posição. Além disso, cobrar a retirada do projeto por parte da Prefeitura, que deveria discutir abertamente o projeto do sanep, que é seu dever enquanto gestora do dinheiro público. As emendas que estão sendo protocoladas, são todas no sentido de modificar o projeto incial e ter a garantia da participação popular. Então, defendemos que as pessoas estejam na Câmara, e cobrem dos vereadores um posicionamento. Além disso, também a imediata retirada do projeto pela Prefeitura.
DM – Qual a tendência da votação em plenário?
R – A princípio temos sete votos contrários, sete votos favoráveis ao projeto, e os demais como indecisos. É necessário pressionar esses votos indecisos. Portanto, há esperanças de que o projeto não seja aprovado. Contudo, a população deve cobrar enfaticamente desses vereadores indecisos uma posição. Esse projeto mudará para sempre e gestão municipal e poderá entregar para o mercado tudo que foi construído a partir do pagamento dos impostos dos cidadãos pelotenses. Será uma tragédia, principalemente para as próximas gerações.