Espaços Públicos de Pelotas estão com menos arte
Desde que foram delimitados os espaços públicos, existem pessoas com suas cores, som ou humor. São os artistas de rua, ofício quase tão antigo quanto a própria civilização.
Recentemente o Diário da Manhã publicou uma matéria sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIn), não acatada pelo Tribunal de Justiça do RS (TJRS), que a Prefeitura de Pelotas havia ingressado contra a lei municipal 6.020/13. A ADIn visava alterar o texto da lei que permitia a comercialização de produtos, para: “fica permitido aos artistas exercer somente de forma gratuita o seu ofício, sendo vedada qualquer forma de comercialização”. Apesar de a fiscalização não proibir que se façam apresentações por gorjeta, o trecho onde diz “somente de forma gratuita” pode ir de encontro a essa prática. Segundo a relatora do processo, desembargadora Denise Oliveira Cezar, a decisão “apenas reafirma liberdades já reconhecidas pela constituição”.
Mesmo com a decisão favorável aos artistas, muitos acabaram saindo das ruas de Pelotas, principalmente aqueles que ficavam no calçadão da Andrade Neves, e outros ainda tiveram problemas em razão da investida da prefeitura para restringir o ofício. Porém, a arte não sumiu por completo das ruas da cidade.
CASAL SHOW
Francisco Teixeira e Lúcia da Silva estão juntos há vários anos. Só Vitória, boneca companheira de dança de Francisco, já tem 29 anos. Enquanto que Januário, boneco companheiro de dança de Lúcia, já está debutando com seus 15 anos.
No entanto, o show do casal já não é mais o mesmo. O Casal Show, que já foi a incontáveis cidades do estado e até mesmo ao Programa do Ratinho, atualmente está sem os recursos necessários para apresentar a famosa dança com os bonecos, embalada por clássicos do brega como Amado Batista e Roberta Miranda. “Tudo com ECAD [Escritório Central de Arrecadação e Distribuição] pago. É engraçado que de nós, que estamos na rua, eles cobram o ECAD, mas o pessoal que toca na noite nunca tem que pagar”, afirma Lúcia da Silva.
O casal, que comercializava os discos com as interpretações e o show, teve de abandonar os bonecos e os equipamentos depois que a prefeitura fechou o cerco para os artistas. Foram vendidos o notebook, o amplificador e o microfone, três peças fundamentais para a apresentação. Hoje, apresentam-se como estátuas-vivas no calçadão para arrecadar o dinheiro necessário para recuperar os equipamentos. Já tocaram em inúmeras festas e feiras em cidades da região e continuam recebendo muitos convites para apresentar o show. No entanto, não têm dinheiro para o transporte e nem para os equipamentos. “Aqui em Pelotas, nem na frente da Fenadoce deixaram a gente se apresentar”, lamenta Lúcia.
O TANGO DE MICAELA
Micaela é outra artista que continua encantando as ruas, com o som característico do Violino chorando tangos no calçadão da XV de Novembro, quase na esquina do Café Aquários. “É o que mais gosto de tocar [o tango]. No início não sabia como ia ser tocar tango no Brasil, mas eu vejo que aqui o pessoal gosta bastante”. Basta ficar pouco tempo ao lado da artista para ver que a recepção da sua música é realmente muito boa.
Micaela Fernandes, 24 anos, é uruguaia de Montevidéu e está há dois anos na estrada e há um ano em Pelotas. Estuda música desde os quatro anos de idade e violino desde os oito. “Toquei por muito tempo em orquestra lá em Montevidéu, mas prefiro tocar na rua. Não gosto daquela coisa burocrática dos concertos, aqui me sinto mais em contato com a música e com as pessoas”.
Depois que saiu de Montevidéu, Micaela tocou por cidades da Argentina e Chile e depois se assentou em Pelotas, acompanhada de seu companheiro e dos dois filhos. Estes, já vão começar a escola aqui mesmo, a artista afirma que ainda não tem previsão de sair.
Mesmo com bom tempo e o súbito calor, a reportagem do Diário da Manhã encontrou apenas estes três artistas apresentando-se nas ruas de Pelotas.