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STÉDILE NA UCPEL : Luta, educação e ciência para transformar

STÉDILE NA UCPEL : Luta, educação e ciência para transformar
27 setembro
08:57 2017

Bem-humorado e contundente, economista gaúcho João Pedro Stédile (MST), abriu o seminário sobre os “100 anos da Revolução Russa”

Por Carlos Cogoy

No fim de semana em São Paulo, onde reside, é recorrente a chegada de visitantes inesperados. Ao atender, depara-se com evangélicos, batistas, enfim, propagadores de diferentes credos religiosos. Numa das ocasiões, o economista João Pedro Stédile – integra a coordenação nacional do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) -, antes do visitante se apresentar, perguntou: “o senhor é petista?”. De imediato, o pregador disse que não. Noutro episódio, dialoga com taxista, que reclama da renda que diminuiu. A conversa avança, e o motorista diz: “A culpa é do PT”. Stédile retruca, afirma que é petista e nunca roubou. Daí o diálogo evolui para a realidade dos bancos, que se mantêm ilesos à crise financeira. Relatadas com bom humor, as cenas prosaicas que se repetem pelo País, sinalizam para aspectos conjunturais. Em relação aos religiosos, Stédile observa que o grupo vai até a periferia e procura os moradores. Já a esquerda não tem esse contato direto, que procura ouvir e dialogar com a maioria da população. Nas opiniões do taxista, avalia, manifesta-se o senso comum, que reproduz a ideologia da classe dominante. Abordagens de Stédile que, segunda à noite, participou da abertura do seminário “100 Anos da Revolução Russa: Reflexões Para a Atualidade”. O evento acontece no auditório da UCPel, e terá atividades até quinta-feira. Confira a programação acessando “Instituto Mário Alves” no Facebook.

Stédile: “inferno tá cheio de D-20 e outras ilusões”

Stédile: “inferno tá cheio de D-20 e outras ilusões”

CRISE – Stédile mencionou que seguidamente o capitalismo enfrenta crises. Porém, disse que o “sistema não morre sozinho. E Marx já recomendava que os trabalhadores fossem os coveiros. É nas crises ques se consegue enfrentar o capital. Quando, no governo Lula, o crescimento era de 7%, e o excedente estava sendo dividido com a distribuição de emprego e renda, havia certa satisfação. Porém, com o incremento das contradições, decorrente do capital financeiro, qualquer seminário e debate, indica a mesma origem para a crise: lógica do capital. Diante disso, segmentos como a Globo, cientes de que as ideias de esquerda podem voltar, tratam de manipular ideologicamente”. O economista reflete que o capitalismo industrial, foi superado pelo capital financeiro e as transnacionais. Assim, a base já não é a produção, que gerava a própria riqueza através da mais-valia e acumulação. No século 20, o capitalismo encontrava nas guerras, uma forma de se renovar. Afinal, os conflitos bélicos destruíam o capital “constante” e “variável”, atingindo maquinário e trabalhadores. Atualmente, no entanto, a guerra já não se viabiliza, pois o controle pode ser eletrônico. De uma sala em Indiana nos EUA, é possível monitorar e atacar.

ESTATIZAR – No cenário atual, quinhentas empresas dominam a economia mundial. E oito bilionários possuem renda superior a dois bilhões de pobres. Para o retorno da acumulação, foi pensada uma “4ª revolução tecnológica”. No entanto, a constatação é de que deveriam ser excluídos 75 milhões de trabalhadores qualificados. Noutra tentativa de alternativa, houve consulta a Nobel de economia. Mas a minoria do capital financeiro, ouviu que a saída não agradaria, ou seja, seria necessário “estatizar o sistema financeiro”.

PODER POPULAR – Para Stédile, outra crise é a natureza do estado burguês. Como consequência, enfatiza, o viés eleitoral está falido.  A forma de democracia da burguesia, iludiu os partidos de esquerda, e não permite transformar o poder. Já a perspectiva do fascismo, diz Stédile, não se consolida pois houve circunstâncias históricas. Segundo ele, o fascimo cresceu quando milhões estavam desempregados, e acreditaram na ilusão de que teriam trabalho. Para isso, acrescenta, contribuiu uma “classe média burra, que Marx chamava de pequena burguesia. Mas prefiro chamar de burguesia pequena, especificamente no bolso, excetuando os professores universitários e padres (risos)”. E a liderança do MST salienta que, a luta de classes é difícil, e o contexto está imerso numa grave crise, porém deve ser engendrada a mudança. “Gramsci falava no poder ampliado, pois a eleição é teatro. A luta deve ser por espaços na sociedade. Então, poder desde os sindicatos, a emissora comunitária, o padre numa missa. E Lênin afirmou que, quando o povo começa a se mobilizar e lutar, aprende em vinte dias, o que deixou de conhecer durante vinte anos. A esperança é que logo chegaremos aos vinte dias”.

Auditório da UCPel repleto na abertura do seminário segunda à noite

Auditório da UCPel repleto na abertura do seminário segunda à noite

Revolução russa

No seminário sobre o centenário da revolução russa, Stédile abordou sobre o episódio histórico, embora salientando que, de acordo com a programação do evento, a temática teria várias manifestações. Daí, após pontuar aspectos da revolução na Rússica em 1917, dedicou-se ao contexto atual.

TERRA – Na revolução russa, afirmou o economista, prevalecia o compromisso da distribuição da terra a quem nela trabalhasse. Coincidentemente, no início do século 20, esse também foi o mote de Zapata no México. “Numa revolução, o mais fácil é entrar no palácio. Por aqui, até já chegamos ao Planalto, entramos e nada mudou, pois são necessárias mudanças estruturais”, disse Stédile, que salientou os sete anos de guerra civil, desencadeada pelo exército branco após a revolução. Com Stálin, a coletivização forçada através da “propriedade estatal” da terra. O conceito, argumentou, não via a terra como mercadoria, mas pertencente a “todo o povo”. No campo, outra etapa foi a de garantir energia elétrica e tratores. Também no interior, foram criadas fábricas de alimentos, como laticínios e frigoríficos.

EDUCAÇÃO – Com a ameaça nazista, no entanto, houve vinte milhões de mortos. Duas mil aldeias foram destroçadas. Ao fim da guerra, população de viúvas. Porém, em quinze anos, a chegada de Gagarin ao espaço que, numa profecia “gremista” – divertiu-se Stédile -, afirmou que a “Terra é azul”. Essa conquista científica e tecnológica, conforme o economista, não foi pela “corrida espacial com os EUA, mas consequência do investimento em educação e ciência. Sem isso, não há povo que se liberte”

MST prioriza a agrecologia

 Em cinco anos houve mudança na metodologia de ação do MST. De acordo com Stédile, após etapa de luta pela “reforma agrária clássica”, que ressaltava a terra para quem nela trabalha, a atualidade implica em cenários complexos. “O Brasil é o maior produtor de arroz orgânico da América Latina. Agora, imagine lavrar um banhado. Sem mecanização agrícola, não teremos vida digna no campo. Então, apenas a posse da terra não resolve. A reforma deve ser também estrutural, contribuindo com o interesse de todos”, afirma.

SAÚDE – Como mudança de paradigma, diz Stédile, a produção de alimentos saudáveis.  “O objetivo tem sido o alimento sem agrotóxico, incentivando a agrecologia, e agroindústria cooperativa. É uma luta que impõe desafios. A exemplo, em Pelotas conquistamos o único curso de veterinária para filhos de agricultores assentados. Reivindicamos em várias universidade, até com reitores próximos à luta social mas, por enquanto, temos apenas um curso assegurado”, disse.

LUTA – Sobre o desafio contemporâneo, cita Lênin e diz: “É hora de forjar os militantes com tempera”. A tempera, explica, é o tratamento que o ferreiro faz e torna algo inquebrantável, então “solidez na convicção das ideias”.

 

 

 

 

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