Voz da periferia pelotense em turnê no País
Por Carlos Cogoy
Dia 3 em Canguçu. Em Pelotas, dias 10 e 11 – evento da Prefeitura. Também no dia 11, apresentação em Piratini. A 15 deste mês, show em Porto Alegre. Novamente Pelotas no dia 18. Ainda em outubro, dia 22 ele estará em Novo Hamburgo. Agenda em novembro: dia 14 em Caxias do Sul; 20 em Florianópolis; 28 em Dom Pedrito. Em dezembro, São Paulo no dia 12. Em Pelotas, shows dias 20 e 25 (Natal no Gueto). Trata-se da turnê “100 Limites”, que divulga o disco homônimo – lançado ano passado – do rapper pelotense Guido CNR. Ele acrescenta que também estão sendo definidas datas para shows em Rio Grande, Bagé, São Lourenço do Sul e Pedro Osório. Guido, um dos poucos rappers pelotenses a levar a voz da periferia pelotense para outros Estados, menciona que o CD já vendeu mil cópias. Empenhado em sobreviver com o Hip Hop, Guido também já comercializou mais de 250 camisetas estilizadas. Outra fonte é o estúdio, onde grava diferentes grupos. Na turnê “100 Limites”, estará acompanhado de Glauco (vocal), Deivid (grafite), MC Duck, DJs Micha e Slot. O rapper também conta com apoiadores: Mess; King Wear Brazil; Verse; Girão Sport Center; King Kong Team; Rap Sul; DiMovie; CNR Produções.
DISCO na avaliação de Guido: “Depois do disco ‘Fúria’, cujo show reuniu mais de quatro mil pessoas na avenida Bento Gonçalves, ‘100 Limites’ teve boa aceitação. Considero como um dos discos mais completos que fiz. O que desejava expor nas músicas, está no disco. E expressei revolta contra o sistema, expus a malandragem que adquiri durante minha vida nas quebradas. Nesse disco, criei minha própria linguagem, a minha maneira de ver. Alguns me chamam de rebelde, outros de ativista. Mas acho que nesse disco eu tenho um pouco dos dois. No videoclipe ‘Medo’ mostro um pouco disso, pois todo preto que cresce ou tem algo no bairro é chamado de traficante e bandido. Ali mostro que a música e arte também podem mudar sua vida, proporcionando vida digna e ajudando a manter o caráter e não ser julgado pelo fato de usar calça abaixo da cintura, boné e camisetão. Também recebi muitas mensagens sobre a música ‘100 Limites’. Nela conto sobre o que fiz e minha história de vida. Por sinal, é parecida com a maioria dos meus semelhantes que moram no gueto, onde muitos nem conheceram o pai. Nas mensagens, relatos de pessoas contando que saíram do crime e hoje vivem dignamente. Porém, momento forte foi quando toquei a música num show. Observei que muitos choravam, sem se envergonhar por derramar lágrimas. Isso acabou me emocionando também”.
MICHA é DJ que tem conquistado reconhecimento no País. Guido comenta sobre a parceria: “A parceria com o DJ Micha surgiu quando ele tocava num grupo de Rio Grande. Já tínhamos contato como amigos e, ao saber que havia terminado o grupo que ele participava, tratei de convidá-lo para tocar com a gente. Isso foi bem antes dele estar em destaque na cena do Rap no Brasil. Até hoje lembro quando fomos de carona para Porto Alegre. Juntamos as moedas para comprar um par de toca-discos, e quase ficamos a pé em plena madrugada num campo de cidadezinha próxima à capital. Naquele momento foi suado, então hoje fico orgulhoso ao ver que ele é destaque. Bem antes de chegarmos aonde estamos, muito suamos e sofremos. E passamos por falta de dinheiro, de equipamentos, até de banho. Além disso, também o preconceito nas festas pois, ao saber que seria Rap, muitos caras não queriam passar o som. Assim, o DJ sempre sofria com essa história”.
NOVA GERAÇÃO do Rap conforme Guido: “Os tempos mudaram, as crianças cresceram, evoluíram e veio a internet. As informações chegam em tempo real. Então não poderia ser diferente, o Rap evoluiu e hoje a molecada canta o que vive. As dificuldades não são como antes, e eles cantam o que vêm, o que viram e conhecem. Não os julgo e gosto de tudo, pois Rap é Rap e ponto. Não sou de criticar, pois não escuto aquilo que não gosto. E graças a muitos caras, portas estão se abrindo. Aprendi muito com o Fill e Pok-Sombra. Esses moleques representam muito bem o Rap da nossa cidade lá fora. E acho isso muito produtivo para todos, principalmente pela visibilidade ao nosso Rap. Claro que sou a favor do Rap de resgate, revolução, mas também falo de amor, de mim e outras mil coisas. Rap é isso”.
POLÍTICA na reflexão de Guido: “Sou do tempo em que havia apenas o Rap político. Então tenho essa essência, mas me readaptei à linguagem atual. Mas o Rap ainda é a voz dos guetos. E a violência tá crescendo, meus irmãos estão morrendo e vivendo na miséria. Enquanto o governo rouba descaradamente, nossas crianças passam fome nas quebradas. Isso gera mais violência. Então como não falar disso nas músicas? E só sobra repressão, o que não regenera ninguém. Os moleques têm a polícia como inimiga, pois é ela que prende, espanca e mata os pais e irmãos. E a cultura aonde está? Esporte nos bairros, incentivo a projetos sociais? Qual emprego para reintegrar o ex-presidiário? Ninguém pensa nisso, então meu Rap é denúncia, desabafo e também munição contra os fascistas do governo”.